Capítulo 16: A Natureza de Wendigo
Após algum tempo de espera, a criatura capturada por Renier e Aura começou a recobrar a consciência. O ser estava imobilizado, com correntes de energia pulsando ao redor de seu corpo, prendendo-o de forma absoluta. Mesmo agitado, seus movimentos eram inúteis contra a força cósmica que o mantinha atado. O golpe que recebeu na cabeça deixara uma rachadura visível no crânio, e seus olhos, brilhando com um ódio primitivo, percorriam o ambiente ao seu redor, buscando alguma chance de fuga.
Renier, no entanto, permanecia à frente da criatura, com os braços cruzados e um sorriso descontraído no rosto. — Boa noite ou bom dia? — provocou ele, com um tom brincalhão, claramente se divertindo com a situação. A criatura rosnou em resposta, tentando avançar contra ele, mas foi imediatamente contida pelas correntes de energia.
— Ah, isso não vai funcionar. — Renier deu um passo à frente, inclinando ligeiramente o corpo em direção ao monstro. — Estas correntes não são feitas de nada que você possa quebrar. Pura energia cósmica. Você não vai se livrar delas… — Seus olhos se estreitaram, o sorriso desaparecendo por um instante. — …a menos que se comporte.
Aura, que observava a cena encostada em uma árvore próxima, deu um passo à frente. Sua katana carmesim brilhou enquanto ela a posicionava sob o pescoço da criatura, o fio mortal da lâmina roçando sua pele. Seu olhar era gelado, repleto de ameaça silenciosa.
— Caso você não colabore… — completou Renier, apontando com o polegar para Aura. — Bem, vamos dizer que existe outra opção. E eu garanto que você não vai gostar dela.
A criatura parou de se debater, mas seus olhos continuavam fixos em Renier. Ele se agachou, ficando à altura do rosto do ser, estudando-o de perto. O silêncio entre eles parecia pulsar com tensão.
— Você nos entende. — Renier afirmou, sua voz agora baixa e calculada. — Eu vejo nos seus olhos que você sabe o que estamos dizendo. Então, vamos acabar logo com isso: fale. Mostre que é mais do que um bicho selvagem. Diga algo… ou a próxima coisa que vai rolar por esta floresta será a sua cabeça.
Por um instante, o ser apenas rosnou, mas então ficou em silêncio. E, para surpresa de ambos, uma voz suave e feminina ecoou, cortando a tensão como um raio.
— Eu os entendo… — disse a criatura, sua voz carregando uma calma inquietante. Ela fez uma pausa, e então completou: — Mesmo neste lugar onde todos os monstros são brutais… nenhum de nós é irracional.
Aura ergueu uma sobrancelha, a lâmina ainda posicionada contra o pescoço do ser. Ela não conseguiu esconder a surpresa ao ouvir aquelas palavras saindo de algo tão grotesco.
Renier inclinou ligeiramente a cabeça, intrigado, enquanto um brilho curioso surgia em seus olhos. “Então, essa voz… é mesmo sua? Ou você está apenas imitando outra pessoa?” Ponderou ele intrigado.
Ele estudava o ser com atenção redobrada, tentando discernir se aquela voz feminina era genuína ou uma artimanha do monstro. Aura, ainda em alerta, apertou a lâmina um pouco mais contra o pescoço da criatura, mantendo-se preparada para qualquer surpresa.
Renier decidiu por fim usar as habilidades presentes nos olhos, analisando a criatura, porém não encontrou qualquer vestígio de falsidade em suas palavras.
— Então que tipo de monstro é você? — indagou Aura de forma séria.
— Não temos muitos nomes… em muitas culturas… — afirmava a criatura. — Mas somos a união de um espírito coletor de almas, nossa fome sempre é insaciável, buscamos mais, e nunca nos preenchemos… pode nos chamar de Wendigo… — afirmou erguendo a cabeça levemente tentando em algum lugar daqueles buracos escuros em seu crânio onde deviam estar os olhos, olhar para Renier.
— Wendigo? — indagou Aura, sem saber o que isso significava.
Renier ergueu-se olhando para a criatura. — Wendigos, são criaturas descritas em vários povos e mitologias, pelo meu mundo, mas a aparência bate com as características dela, um Espírito maligno associado ao inverno, fome e canibalismo… — informou ele, a analisando. — A várias formas de se transformar em um, a mais comum, sendo consumir a carne humana, dizem ter propriedades que fazem eles viram esses seres tão bizarros…
— Você tem conhecimento, normalmente todos nos chamam porque qualquer nome, banal — afirmava o Wendigo.
— Sim, existe uma crença no meu mundo, é um simbolismo por trás de sua lenda. O Wendigo é frequentemente associado a avareza, fome insaciável e perda da moralidade, simbolizando o que acontece quando alguém se entrega à ganância ou à violação de tabus sociais. — informou Renier, a olhando com toque curioso. — Mas aqui está você se comunicando como alguém que tem ciência da sua natureza.
Aura assentiu. — Isso é um pouco estranho, se a lenda por trás dessa criatura for verdadeira, porque você consegue se comunicar normalmente? — perguntou Aura olhando para o Wendigo.
— Eu sou… diferente… — afirmou o Wendigo de forma vaga.
Aura estreitou o olhar, e estava pronta para tirar as respostas à força, porém Renier interveio estendendo a mão para ela abaixar a espada, de forma relutante ela o fez, querendo saber o motivo dele, nesse monstro.
— Nosso objetivo não é estudar o comportamento de monstros estranhos onde a Floresta Perdida por si só já é uma grande anomalia, — afirmou Renier. — Queremos três informações, se você colaborar em ajudar, vai ser liberada, o que acha? — perguntou, voltando o olhar para o Wendigo.
O Wendigo ficou pensativo, ponderando com sua respiração quente, procurando algum indício de que Renier estava falando a verdade sobre libertá-la.
— Que tipo… De informações seriam essas? — indagou ela.
— Sabemos e você sabe, que o Selo do Demônio reside nessa floresta, e os monstros que também aqui existem, — afirmou Aura, abaixando a espada e caminhando para perto de Renier, porém ainda em vigia sob qualquer ameaça que poderia surgir.
— Queremos saber sobre a entidade que vive aqui, os que mantêm a Floresta Perdida oculta… — completou Renier, enquanto colocava a mão sob a cintura.
O Wendigo ficou em silêncio por um breve momento. — Busca-lo, é suicídio… O que faz pensar que seriam capazes que sequer enfrenta-lo? — indagou ela, de forma cética.
— Isso não é da sua conta, — disse Aura apontando a lâmina para o pescoço do Wendigo. — Passe as informações e a localização dele. Além do mais, não há um motivo para você se preocupar com duas pessoas que mesmo que não morram pelas suas mãos, talvez morram pelas mãos dele, não é mesmo?
— Isso é… lógico. — Wendigo balançou a cabeça, voltando o olhar para Renier. — Eu… mostro para vocês, não tenho porque confiar nas palavras dos dois, se eu der as informações… como terei certeza que não irão me matar em seguida?
— Como teremos certeza, que você não nos levará para uma armadilha? — indagou Aura, cética na proposta da criatura.
— Temos um impasse… — murmurou Renier, olhando para as duas, ambas tem personalidade forte, pensava Renier.
Como alguém de fora do mundo, Renier estava indiferente quanto ao Wendigo apesar dos mitos e lendas que ressoam com essa criatura, mas sua curiosidade estava ativada, conforme cada vez mais, ela falava, como se fosse interessante descobrir mais do que uma simples besta selvagem movida apenas pelo instinto primitivo de uma fome insaciável.
— Trato feito, você será a nossa guia nesta floresta, — afirmou Renier, estalando os dedos fazendo com que as correntes de energia sumissem dos braços e perna dela.
O Wendigo se viu surpresa, assim como Aura, que estava incrédula por Renier ter aceitado as condições, e liberado a criatura do seu confinamento.
Renier então apontou para seus olhos azuis que brilhavam intensamente. — Escute, Wendigo, eu sei quanto você mente ou quando diz a verdade, essa é uma habilidade que carrego em meus olhos, se eu notar qualquer falsidade em suas palavras ou em qualquer movimento suspeito, Aura ficará encarregada de dar um fim a você. — afirmou Renier de forma séria, porém esboçou um sorriso sincero logo em seguida. — Dito isso, estarei contando com você de agora em diante, então seja uma boa garota e nos mostre o caminho, certo?
O Wendigo mostrou uma leve hesitação com esse sorriso, a resposta fria e até afrontada seguida por um sorriso tão contagiante. — C-certo… Vou ser uma boa… garota… — afirmou ela, sem entender exatamente como esse garoto tinha tanta autoridade assim sobre ela.
Aura se conteve com isso, soltando um suspiro involuntário. “Parece que um Guardião tem seu próprio meio de resolver as coisas…” pensou ela, olhando para Renier com interessante, vendo a facilidade que ele conseguiu controlar a situação, e não só isso fazer uma criatura tão feroz e primitiva colaborar de tal forma.
Mas para Renier, parecia que tudo era apenas uma diversão em um lugar, onde nem mesmo a luz do sol penetrava, sua leveza era um contraste, talvez um brilho que esse lugar não conseguia reprimir de forma alguma, mas por quanto tempo isso iria continuar?
Continua…
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