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    Conforme Renier ajustava sua visão à escuridão, seu olhar se abriu para uma cena de tirar o fôlego.

    O céu acima era um espetáculo hipnotizante, cravejado por estrelas que pareciam absurdamente próximas, como se a própria vastidão do cosmos estivesse ao alcance das mãos. Ele inspirou fundo, absorvendo a imensidão daquele novo ambiente, antes de murmurar para si mesmo:

    — Então, atravessar para outra realidade pelas raízes dentro da Organização funcionou bem…

    Erguendo-se lentamente do solo rochoso onde havia despertado, sentiu o peso do novo mundo ao seu redor. No entanto, antes que pudesse sequer se situar, um som agudo e ensurdecedor cortou o silêncio brutalmente.

    — Droga… — resmungou, levando a mão à orelha numa tentativa inútil de abafar o ruído.

    A voz furiosa da Dra. Jennifer explodiu pelo comunicador, carregada de frustração contida.

    — Você finalmente decidiu acordar!

    Dentro da Organização, alguns funcionários acompanhavam a cena pelos monitores, prendendo a respiração ao notar a irritação crescente da cientista. Ninguém ousava interferir. Qualquer que fosse o erro de Renier, não era algo que gostariam de discutir diretamente.

    Ele piscou, confuso com a recepção calorosa.

    — Hã? Por que essa reação exagerada?

    Do outro lado, Jennifer suspirou profundamente, massageando a testa como se estivesse lidando com um caso perdido.

    — Lembra do que eu te disse horas antes de você atravessar para esse universo?

    Renier inclinou a cabeça, puxando a memória.— Você disse para eu controlar minha energia… — respondeu, hesitante.

    — E o que aconteceria se você ultrapassasse esse limite? — retrucou ela, exasperada.

    Houve um breve silêncio antes que a ficha caísse.

    — O traje criado pela Administradora iria… me dar uma descarga… Ah…

    Sua voz foi murchando à medida que a realidade se tornava dolorosamente clara.

    — Eu… desmaiaria e cairia no chão…

    Renier estreitou os olhos, sentindo o gosto amargo da constatação. De fato, ele estivera inconsciente até poucos instantes atrás. A sensação não era nova. Não era a primeira vez que despertava assim em um mundo estranho… e, com sua sorte, provavelmente não seria a última.

    A voz de Jennifer cortou seus pensamentos como uma lâmina afiada.

    — Quer que eu refresque sua memória?

    Ele cruzou os braços, seu olhar varrendo os arredores com atenção renovada. O terreno era áspero e irregular, formado por desfiladeiros profundos que serpenteavam pelo solo como cicatrizes de uma guerra antiga.

    — Não será necessário… — disse ele, já compreendendo o que havia acontecido.

    E o cenário ao seu redor só confirmava suas suspeitas. O chão estava um caos de destroços, fragmentos de espadas de ferro semi-enterradas entre os escombros, marcas de impacto espalhadas por toda parte… e cadáveres. Criaturas com escamas retorcidas jaziam no solo, evidências silenciosas de sua chegada nada discreta.

    Ele soltou um suspiro. — Pelo visto, fiz um belo estrago na minha entrada…

    Jennifer, do outro lado, respirou fundo, digitando rapidamente nos teclados holográficos à sua frente.

    — Coloque o capuz, — ordenou ela. — A máscara de kitsune foi projetada com uma interface especial. A partir daqui, posso enviar informações em tempo real direto para você.

    Renier girou os ombros, sentindo o peso do traje se ajustar aos seus movimentos. Com um gesto fluido, puxou o capuz sobre a cabeça e ajustou a máscara. O brilho azul-neon de energia reluziu nos olhos ocultos sob a superfície lisa e metálica.

    Dentro da máscara, sua visão era clara, nítida, como se não houvesse nada sobre seu rosto. No entanto, havia detalhes sutis que lembravam que ele estava filtrando o mundo por meio da interface da Organização. Pequenos ícones piscavam nos cantos de sua visão, linhas de dados corriam discretamente ao longo da borda inferior, analisando o ambiente em tempo real.

    Então, um vídeo surgiu diante de seus olhos, transmitido diretamente pela Dra. Jennifer.

    O visor projetava a chegada de Renier a esse universo, capturada por alguma câmera de alta altitude. Seu impacto havia sido tudo, menos discreto.

    A gravação começou com um clarão azul explodindo no céu, marcando o instante exato em que ele surgiu no topo de uma das grandes rochas que margeavam a ravina. Era uma visão quase divina, Renier de pé, sua silhueta recortada contra a luz intensa de um círculo mágico colossal, suspenso no ar como um sol artificial. Gravuras arcaicas pulsavam no centro do selo, formando padrões complexos de energia pura.

    — Sua entrada chamou um exército inteiro, gênio — a voz de Jennifer ecoou pelo comunicador, carregada de sarcasmo.

    A imagem ampliou, revelando uma tropa se movendo ao longo da estrada abaixo. Guerreiros de pele escamosa, com armaduras carmesim que refletiam as chamas de suas flechas encantadas. As carruagens e lanças reforçavam a formação militar, um espetáculo de disciplina e poder bélico.

    — Lizardmans — explicou Jennifer. — Uma subespécie dos Dragões. Parece que você aterrissou direto no meio do território deles.

    Renier observava atentamente o desenrolar da cena. No vídeo, os arqueiros já haviam preparado seus arcos, e flechas flamejantes foram disparadas em uníssono contra ele.

    Seu outro “eu” reagiu imediatamente.Sem hesitar, Renier ergueu a mão.

    O círculo mágico resplandeceu em uma luz ofuscante, respondendo ao comando silencioso de seu criador.

    Então, sua mão desceu.

    A ativação do feitiço foi instantânea. Uma onda de espadas de energia azul disparou do círculo mágico como um vendaval de trovões. Relâmpagos se entrelaçaram em um frenesi destrutivo, rasgando o ar, explodindo contra os Lizardmans com força avassaladora. As linhas de frente foram obliteradas antes mesmo de poderem reagir.

    Mas havia um problema.

    Mesmo enquanto seus ataques devastavam o inimigo, a estrutura das ravinas começou a ceder. Rochas tremiam, rachaduras se espalhavam como teias de aranha. No vídeo, era possível ver que Renier não parava, o feitiço crescia em intensidade, raios estalando por toda a paisagem, espalhando destruição indiscriminadamente.

    — Foi aí que eu percebi que você não ia parar — murmurou Jennifer.

    As imagens tremeram violentamente quando o solo abaixo de Renier desmoronou. Seu corpo foi arrastado pela avalanche de pedras, despencando no abismo abaixo. O vídeo se tornou um borrão de escuridão, o visor mergulhando no vazio.

    Jennifer suspirou, voltando a digitar nos teclados holográficos.

    — E foi quando eu ativei o protocolo de emergência do traje. Sua energia estava fora de controle, então ele te nocauteou com uma liberação de energia, — afirmou ela.

    A interface da máscara brilhava suavemente, exibindo dados em tempo real sobre o ambiente. Pequenos ícones no canto da tela indicavam diversas funções do traje, enquanto no topo, um marcador mostrava a hora exata naquele universo.

    Renier arqueou uma sobrancelha. — Parece um jogo… — murmurou para si mesmo, observando a rosa dos ventos no canto inferior da interface, indicando sua localização.

    Jennifer bufou do outro lado da comunicação.

    — Foi mal, apenas me deixei levar… — disse Renier, ajustando levemente o capuz.

    — Vou relevar… — respondeu ela, sua voz carregada de insatisfação. — Afinal, eles foram hostis primeiro, então não posso te julgar por revidar.

    A cientista digitou algo em seu console, e um pequeno ponto luminoso surgiu na interface de Renier, destacando uma direção clara.

    — Siga para o sul. A interface da máscara já está configurada para te guiar.

    Renier piscou ao ver a indicação. — Isso é bem conveniente.

    — Eu sei. Diferente de você, eu sou organizada — retrucou Jennifer com um leve toque de provocação. — Aliás, aqueles ícones no canto da tela são para manter tudo em ordem. Você pode ser inteligente, mas quando se trata de criar armas ou dispositivos, é um completo desastre.

    Renier abriu a boca para rebater, mas antes que pudesse dizer algo, Jennifer continuou:

    — Agora, faça um teste. Levante a mão e pense em todas as espadas, arcos, flechas, moedas e ouro… Até mesmo os cadáveres dos Lizardmans soterrados sob as rochas.

    — Hã? — Renier franziu o cenho.

    — Apenas faça.

    Ainda um pouco hesitante, ele ergueu a mão e focou nos destroços ao redor. O ar ao seu redor vibrou levemente antes que um brilho azul-etéreo começasse a emanar das pedras e dos restos da batalha. Uma a uma, armas, armaduras, fragmentos de ouro e até os corpos dos inimigos começaram a se desmaterializar em partículas luminosas, desaparecendo no ar.

    Na interface, os números dos ícones começaram a subir rapidamente. +10, +50, +200… e então passaram de +999, piscando em vermelho como se alertassem para o volume absurdo de itens coletados.

    Renier sentiu um arrepio de desconforto.

    — Uh… Jennifer? Tem… muita coisa aqui.

    Do outro lado da comunicação, a cientista soltou um risinho travesso.

    — Ótimo! Agora vá andando e organizando tudo isso.

    — Espera aí…! — Renier tentou protestar, mas foi imediatamente interrompido.

    — Ah-ah! Nem vem reclamar depois da bagunça colossal que você causou só de pisar nesse universo!

    Renier suspirou profundamente, passando a mão pelo rosto antes de simplesmente começar a andar.

    — Isso vai ser um saco… — murmurou, enquanto sua interface ainda piscava, avisando que havia muito trabalho pela frente.

    Continua…

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