Capítulo 69: Território dos Morales.
A carroça que transportava Renier, Lívia e Priscila entrou pela grande cidade, que parecia mais uma fortaleza, com muros altos e imponentes. O som de pessoas conversando, rindo, e o barulho de trabalho estavam por toda parte. O ambiente era movimentado, com comerciantes gritando ofertas e crianças brincando nas ruas.
Ao descer da carroça, Priscila fez um gesto para um dos soldados. — Leve Lívia até a igreja. Eles podem tratar do ferimento dela.
Renier sorriu para Lívia, seu olhar suavizando por um momento. — Fico feliz que você receba um bom tratamento.
Lívia, ainda um pouco vermelha pela experiência, olhou para ele com um sorriso sincero. — Depois que tudo isso acabar, — ela disse com uma voz tímida. — Vou agradecer você pessoalmente por me salvar.
Renier tentou afastar, fazendo um gesto despretensioso. — Não precisa disso, — ele respondeu, com um tom suave. — Está tudo bem.
Porém, ela se aproximou dele, insistindo, como se quisesse deixar isso claro. — Quero agradecer. Fique por perto. Vou fazer isso!
Ela então se afastou, indo com o soldado para a igreja, mas não sem antes reafirmar. — Eu vou agradecer, Renier. Não se esqueça disso!
Renier observou-a partir de longe, sorrindo de leve, antes de virar sua atenção para Priscila, que, com um sorriso de canto, disse:
— É difícil ver Lívia agir assim.
Curioso, Renier arqueou uma sobrancelha. — Dessa forma, como?
Priscila cruzou os braços, seu olhar suavizando, mas ainda carregando uma dose de disciplina. — Comportamento de garota envergonhada perto de um garoto, — ela disse, rindo baixinho. — Não é algo que ela faz com frequência.
Antes que Renier pudesse comentar, Priscila rapidamente mudou de assunto. — Vamos, preciso te levar a Otto. Ele vai ajudá-lo a reaver seus documentos e, claro, garantir sua permissão para ficar na cidade.
Renier ficou intrigado. “Permissão para ficar na cidade?” Ele levantou uma sobrancelha, mas, percebendo que seria melhor não perguntar muito naquele momento, seguiu em silêncio, acompanhando Priscila até o destino.
O caminho pelas ruas da cidade foi curto, mas Priscila não demorou a puxar conversa. — O que você fez ali, — ela começou, sua voz curiosa, — foi algo bem… inédito para um mercador. Como conseguiu derrubar aquele Wivery com apenas um golpe?
Renier sorriu suavemente, sem se apressar em dar uma resposta. — Todo mundo tem seus segredos, — ele disse com um tom enigmático. — Eu prefiro dizer apenas o necessário. O que importa é que eu salvei a pele dos seus soldados e matei aquele Wivery. E ainda passei algumas informações do diário de Morales para você.
Priscila o olhou de forma afiada, mas logo seus lábios se curvaram em um sorriso. — Eu gosto desse seu comportamento ousado. — Ela pausou por um momento, a postura rígida dando lugar a um toque de divertimento. — Você não fez nada de errado, então acho justo eu não te perguntar mais nada. Mercador, — ela enfatizou a palavra com um toque de provocação.
Renier não pode deixar de sorrir, ciente de que sua resposta a deixou curiosa, mas sem pressa para revelar mais do que o necessário.
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Ao chegarem a uma área com um misto de comércio e estrutura militar, Renier observou o ambiente ao redor. Carroças e mercadores seguiam com suas rotinas, enquanto soldados patrulhavam calmamente, mas com seriedade. O som distante de espadas se cruzando indicava que um treinamento militar acontecia por perto.
Priscila entrou sem cerimônia em um prédio imponente e não hesitou em falar alto:
— Otto está por aqui?
Um homem de cabelos esverdeados e óculos surgiu de trás de uma pilha de papéis, ajeitando a túnica enquanto suspirava.
— Estou, estou — ele respondeu, ajeitando os óculos. — Mas, Capitã, será que precisa gritar toda vez que entra aqui?
Priscila ignorou completamente o comentário e, com um toque firme nas costas de Renier, foi direto ao ponto:
— Esse jovem mercador perdeu seus documentos e suas mercadorias. Preciso que você faça novos para ele.
Renier já havia captado a dinâmica daquele lugar. Tudo ali parecia funcionar na base de ordens diretas e sem rodeios.
Otto riu suavemente. — Sempre tão objetiva… — Ele então olhou para Renier, avaliando-o. — Para reaver seus documentos, precisará pagar duas moedas de bronze. Se quiser uma permissão de permanência na cidade por dez dias, será necessário também uma moeda grande de prata.
Priscila cruzou os braços, já antecipando a conversa. — Ele está sob os cuidados do exército do Barão. A conta não será dele.
Otto arqueou uma sobrancelha. — Sortudo, hein? — Ele fez um gesto para que Renier o seguisse.
Sorte” não era bem o termo que Renier usaria. Mas, considerando que ele não tinha nenhuma moeda daquele mundo, preferiu não reclamar e apenas seguiu Otto.
Foi então que Priscila continuou. — Ele merece isso. Salvou a filha de um conde e matou sozinho o Wivery. O dinheiro que seria dado aos soldados por esse feito, agora pertence a ele. Nada mais justo.
Otto fez um som pensativo, olhando de soslaio para Renier. — Se conseguiu derrubar um monstro daqueles, então realmente é forte.
Eles seguiram até uma sala iluminada por uma esfera flutuante de luz, posicionada diante de um espelho alto. Otto se aproximou do objeto e fez um gesto para Renier.
— Coloque a mão no orbe.
Renier ergueu uma sobrancelha. — Isso não vai explodir, vai?
Otto riu. — Não, apenas vai registrar o seu status no reino. Mas, se tiver algum crime nas costas, o espelho vai mostrar. Tem algo a temer?
Renier apenas deu um sorriso irônico. — Provavelmente não. Pelo menos, não que eu tenha percebido.
Ele colocou a mão no orbe, e um brilho branco intenso preencheu a sala. Então, as informações surgiram no espelho.
Nome: Renier KanemotoIdade: 16 anos…
Classe: Guardião Negro (Principal) / Mercador (Secundária)
Habilidades: Combate com espadas e lanças; Magia de fogo, água, terra, vento, luz e escuridão.
Raça: Desconhecida…
Otto assobiou, impressionado. — Garoto, você é praticamente um arsenal ambulante. Ele então olhou com curiosidade. — Você é filho de algum nobre?
Renier respondeu sem hesitar. — Não.
Otto ajustou os óculos. — Estranho. É raro alguém fora da nobreza ou da realeza ter um sobrenome.
Renier ponderou. “Então um sobrenome era considerado um luxo por aqui?”
Priscila interrompeu os pensamentos dele. — Então, você é mesmo um mercador… Mas o que significa esse “Guardião Negro”?
Renier deu de ombros. — Um título besta que ganhei tempos atrás. Não significa nada.
Otto não insistiu e fez um gesto para que Renier retirasse a mão do orbe. Pegou uma plaqueta de bronze e entregou a ele. As informações estavam entalhadas na superfície metálica.
— Isso serve como identificação.
Então, Otto lhe entregou uma pequena barra de ferro.
Renier olhou o objeto com desconfiança. — E isso aqui?
— É o seu passe de estadia. — Otto explicou. — Ele contém um encantamento de ferrugem. Você pode ficar na cidade por dez dias. Quando o tempo acabar, a barra começará a enferrujar. Se um soldado te encontrar depois desse prazo, terá que pagar uma multa de uma moeda grande de prata.
Priscila cruzou os braços, completando com um tom mais severo:
— Caso não tenha como pagar a multa, será rebaixado a escravo.
O sistema dali parecia rígido, mas Renier não discutiu. Ele girou a pequena barra de ferro entre os dedos e então a guardou.
— Entendido.
Se ficaria mais que dez dias, ou se arrumaria um jeito de sair antes disso… era algo que ele decidiria depois.
Otto ajustou os óculos, lançando um olhar breve a Renier antes de finalizar:
— Agora você é oficialmente bem-vindo ao território da Família Morales.
O mesmo sobrenome do General Morales… Renier ponderou por um instante. Era óbvio que o diário que encontrou acabaria indo parar nas mãos deles. Só esperava que não resolvessem procurá-lo depois disso.
Priscila agradeceu a Otto com um aceno rápido antes de se virar para Renier. — Vamos.
Os dois deixaram o prédio e seguiram pela rua principal. A cidade era movimentada e barulhenta, com carroças indo e vindo, mercadores anunciando seus produtos e o burburinho constante de negociações. Mais adiante, no horizonte, imponentes casas se destacavam, claramente pertencentes à nobreza.
Depois de alguns minutos caminhando, Priscila parou e cruzou os braços.
— Agora eu preciso ir. Tenho relatórios para entregar no quartel-general. — Ela lançou um olhar avaliador para Renier. — Você vai ficar bem sozinho, não vai?
— Vou sobreviver.
Priscila riu, mas logo acrescentou: — Ah, e fique atento. Quando estiver melhor, Lívia provavelmente vai te procurar.
Renier ergueu uma sobrancelha. — Ela parece bem determinada quanto a isso.
— E ela é. — Priscila sorriu de canto.
Renier então perguntou: — Você conhece alguma estalagem por aqui?
Priscila acenou e apontou para um edifício de dois andares um pouco mais adiante. — Aquele ali. Você vai reconhecer pelos vasos de flores na entrada. É um pouco caro, mas tem o melhor atendimento e comida da região.
Renier seguiu o olhar dela e memorizou o local. — Entendido. Valeu pela recomendação.
Ele então acenou para Priscila e começou a caminhar pela calçada de pedra da cidade, misturando-se à multidão.
Agora, Renier estava por sua conta…
Continua…
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