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    A extensão desolada da Costa Esquecida estava diante de Sunny, envolta em escuridão. O céu negro era vasto e vazio. Não havia estrelas, nem lua, nem sol povoando o abismo sem luz, fazendo-o parecer ilimitado. Diante da eternidade oca de sua grandeza insondável, Sunny não pôde deixar de se sentir indescritivelmente pequeno.

    Abaixo do céu negro, um deserto árido se estendia até onde os olhos podiam ver. A Costa Esquecida havia mudado, tornando-se quase irreconhecível… o Terror da Torre, Sol Sem Nome, estava morto, e o mar infinito de coral carmesim que havia nascido dela também se fora, substituído por pó acinzentado.

    A escuridão que envolvia a extensão desolada era absoluta. Mas era meramente a ausência de luz, não a verdadeira escuridão que habitava o abismo do Submundo. Portanto, o olhar de Sunny podia perfurar seu véu sem restrições.

    A Costa Esquecida… tornou-se uma terra de sombras.Seus lábios sem sangue se contorceram em um sorriso pálido.

    “Voltei.”

    —— —— ——

    Levou mais alguns dias para que ele descesse das Montanhas Ocas e deixasse as encostas escuras para trás, finalmente pisando na Costa Esquecida novamente. Cercado pelo mar de poeira cinzenta e silêncio absoluto, Sunny permaneceu imóvel por um tempo, olhando para longe com uma expressão estranha no rosto machucado. A falta de luz, a falta de som, a falta de vida…

    “Que paz.”

    Era uma terra de morte.

    Ele andou alguns passos para frente, e então cambaleou, caindo de joelhos. Suas mãos se afogaram na poeira, e sua respiração se tornou difícil, assobios roucos escapavam de sua boca cada vez que seu peito subia e descia.

    “Argh… aaahh…”

    Sunny estava sufocando. Não era por falta de ar, mas simplesmente porque tanto sua mente quanto seu corpo estavam em turbulência. Ele estava tendo uma estranha aparência de um ataque de pânico, causado pelo fato de que não havia mais névoa ao redor dele.

    Não havia nada, e portanto, Sunny não precisava mais lutar para continuar existindo. Ele tinha se acostumado tanto com essa necessidade constante, porém, que sua falta era como um choque poderoso. Tudo ao redor dele era tão sólido e imutável, tão tátil e palpável… tão alguma coisa.

    Tudo era alguma coisa. Não era bizarro?

    Como se viu, era possível experimentar um ataque de pânico a partir da sensação de alívio. Esse sentimento era tão poderoso que debilitou Sunny completamente, tornando-o incapaz de pensar, se mover ou se controlar. Ele permaneceu de joelhos por alguns momentos e então se esparramou na poeira.

    “Está tão calmo…”

    Logo ele se enrolou como uma bola… e adormeceu pacificamente.

    —— —— ——

    Sunny dormiu sem sonhos por vários dias. Ele ficou surpreso e preocupado com o tempo que seu corpo original permaneceu dormindo, mas julgou que ele merecia um pouco de descanso. Ou talvez muito. Passar um ano e meio nas Montanhas Ocas não era para os fracos de coração… na verdade, era pura loucura. Se Sunny soubesse o quão longa e terrível seria sua jornada, ele nunca teria se aventurado na névoa.

    Ou talvez sim. Talvez ele ainda tivesse ido para o nada. Afinal, embora cruzar as Montanhas Ocas tenha sido um pesadelo, também foi… divertido, de uma forma perversa e mórbida. Também foi bastante proveitoso, temperando sua vontade e aprimorando suas habilidades.

    Sunny era um Transcendente agora, e então, suas habilidades precisavam se tornar transcendentes também. Na verdade, ele estava contemplando o conceito de uma arte de batalha transcendente ultimamente… De qualquer forma, seu corpo precisava descansar, então ele o deixou dormir. No entanto, dormir na poeira não era muito confortável.

    Ele manifestou um avatar e convocou o Mímico Maravilhoso. Uma vez que a Sombra se transformou em uma cabana, o avatar carregou seu corpo para dentro e o colocou na cama improvisada — que nada mais era do que uma plataforma elevada formada pelo Mímico em seu nome.

    Santa, Serpente, Diabo e Pesadelo protegiam a cabana, cada um fortalecido por uma das sombras. O avatar, enquanto isso, fez uma fogueira e foi preparar um pouco de comida.

    Quando Sunny acordou, havia um verdadeiro banquete esperando por ele na mesa. Ele permaneceu imóvel por um tempo, então suspirou e sentou-se, esfregando os olhos. O travesseiro e o cobertor que ele havia manifestado antes se dissolveram lentamente em sombras.

    O avatar gesticulou para a comida com um sorriso.

    “Venha comer. Tenho dez tipos diferentes de carne de monstro para você aproveitar.”

    Sunny estava com muita fome, então não perdeu tempo. Dando a primeira mordida, ele demorou-se por alguns instantes e então perguntou sombriamente:

    “Ficamos sem sal?”

    O avatar deu de ombros.

    “Você sabe que sim.”

    Sunny soltou outro suspiro.

    “E o café?”

    O avatar olhou para ele com diversão.

    “Sobrou um pouco. Vamos guardar para uma ocasião especial.”

    Sunny não precisava se fazer essas perguntas, é claro, porque ele já sabia todas as respostas. Mas, ainda assim… era mais agradável comer enquanto desfrutava de uma conversa amigável, mesmo que estivesse falando sozinho. Sua comitiva era ótima em muitos aspectos, mas nenhum deles era do tipo falante… na verdade, o único que já tinha falado era Diabo, mas era melhor que esse cara ficasse de boca fechada.

    Terminando seu café da manhã, Sunny montou em Pesadelo, dispensou o resto das Sombras, assim como o avatar, e seguiu para o norte. A escuridão os acolheu em seu abraço acolhedor, e o pó cinzento subiu no ar, agitado pelos cascos adamantinos do tenebroso garanhão.

    —— —— ——

    Foi estranho.

    Sunny se lembrava vividamente da longa jornada de volta à Cidade das Trevas que ele e os membros da coorte fizeram depois de visitar as Montanhas Ocas. Naquela época, tinha sido uma batalha sem fim pela sobrevivência — o Labirinto Carmesim estava cheio de todos os tipos de Criaturas do Pesadelo vis, e todas essas criaturas queriam provar seu sangue.

    Mas agora, as Criaturas do Pesadelo se foram, aniquiladas pelo sol implacável. O Labirinto Carmesim também se foi, sua ruína foi causada pela destruição do sol. O labirinto de corais havia murchado na ausência de sua fonte e se desintegrado em pó. Agora, não havia ninguém para atacar Sunny da escuridão. Não havia nada além de morte e desolação ao redor dele.

    Silêncio e paz.

    Ele cavalgou Pesadelo para o norte em um ritmo suave, sem pressa para chegar ao seu destino. Balançando suavemente na sela, Sunny sorveu água da Primavera Eterna e olhou ao redor, seu olhar cheio de plácida curiosidade.

    “Acho que reconheço aquele lugar… não, reconheço?”

    Era difícil se orientar no mar de poeira. Havia alguns pontos de referência que Sunny teria reconhecido, mas ele entrou na Costa Esquecida em um local diferente de onde o grupo tinha ido. Sua rota era totalmente diferente, e ele poderia estar a centenas, ou até mesmo milhares de quilômetros de distância dos lugares que o grupo tinha visitado.

    Bem, não importava. Se Sunny quisesse, ele poderia passar o resto da vida aqui. Ele encontraria o que estava procurando eventualmente. Não, na verdade, isso não estava bem certo. Já que havia muito poucas Criaturas do Pesadelo na Costa Esquecida agora, se é que havia alguma, seus suprimentos acabariam eventualmente. Então, seu tempo era limitado, afinal.

    A risada de Sunny ecoou no silêncio tranquilo.

    “Deuses. Nunca pensei que teria um problema desses…”

    Não havia abominações suficientes por aí! Que farsa. Não foi irônico?

    Sunny viajou a cavalo por alguns dias, então se transformou em um corvo e voou para o céu negro sem limites. Levado pelos ventos, ele voou acima do mar de pó cinzento e seguiu para o norte enquanto observava a terra desolada em busca de quaisquer marcos familiares. Nenhum monstro se lançou contra ele da poeira, ou do abismo negro acima. Esta terra, que havia se tornado sinônimo de medo e perigo em sua mente, agora estava estranhamente pacífica.

    Parecia mais segura até do que o mundo desperto, e muito menos do que outras regiões do Reino dos Sonhos. Sunny abriu o bico e soltou alguns grasnidos estridentes, rindo da ironia.

    “Seria engraçado… se não fosse tão triste.”

    … Depois de voar sobre o deserto árido por mais alguns dias, ele encontrou o que procurava. As ruínas da Torre Carmesim.

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