Capítulo 1777 - Inferno sobre rodas.
De manhã, Rain saiu rastejando de sua tenda sentindo-se descansada e revigorada. O sol mal tinha se mostrado, surgindo acima do horizonte distante em toda sua glória pálida — o mundo ainda estava envolto em escuridão, mas pelo menos dava para ver para onde estavam indo. Uma das primeiras coisas que Rain notou depois de chegar a Ravenheart foi o quão mais escuras eram as noites no Reino dos Sonhos, em comparação com NQSC. Lá fora, no mundo desperto, a humanidade havia derrotado e banido a escuridão de seus lares, mas aqui, ela ainda era um inimigo tirânico.
“Ah… que frio.”
O principal acampamento de construção já era uma colmeia de atividade. Os mortos continuavam a labutar silenciosamente à distância, o som de seu trabalho incansável alcançando o pequeno assentamento de tendas como uma maré persistente. A essa altura, a estrada já havia se estendido muito além da paliçada defensiva, então todo o acampamento teria que ser movido em breve — as equipes de estrada eram nômades por natureza, seguindo as estradas que construíam.
Os trabalhadores do turno da noite estavam retornando para suas tendas, enquanto aqueles designados para o turno do dia, como ela, estavam acordando. Os guerreiros Despertos que protegiam o acampamento estavam em patrulha, comida estava sendo preparada, e lanternas de óleo estavam sendo colocadas para fora.
Todos estavam se preparando para um novo dia de trabalho. Rain bocejou, esfregou os olhos e caminhou lentamente até o banheiro comunitário. Felizmente, as trabalhadoras tinham um espaço separado para manter a higiene, e como a maioria dos trabalhadores contratados consistia de homens, não estava muito lotado. Ainda assim, havia sussurros pelas costas dela — o corpo de Rain, afinal, era uma visão ótima para se ver… o que significa que era um pouco assustador de se ver, já que ela nunca teve a chance de visitar um curandeiro depois de matar o Caçador.
Os hematomas já tinham desaparecido quase completamente, mas durante seus primeiros dias na equipe de estrada, sua pele era tão preta e azul quanto clara e branca. As bandagens que ela usava para cobrir o corte em seu lado também não estavam mais sangrentas. As trabalhadoras estavam mais relaxadas perto dela, mas ainda um pouco cautelosas.
Rain lavou seu rosto, escovou seus dentes e tremeu miseravelmente de frio por um tempo. Então, bem acordada, ela retornou para sua barraca e vestiu sua jaqueta. O café da manhã foi tão insípido quanto o jantar, mas pelo menos foi preparado com ingredientes de verdade, não com pasta sintética — o solo vulcânico ao redor de Ravenheart era extremamente fértil, então as colheitas dos campos eram suficientes não apenas para alimentar a cidade inteira, mas também para abastecer os outros assentamentos do Domínio de Song com alimentos.
Rain comia em solidão, já que ninguém era corajoso o suficiente para se aproximar dela. Os trabalhadores homens frequentemente lançavam olhares furtivos em sua direção, mas timidamente mantinham distância. Ela não sabia o que era tão assustador sobre ela, realmente… talvez fosse a aura afiada e selvagem de uma caçadora de abominações, ou as olheiras que estavam constantemente sob seus olhos por causa da falta de sono.
Ela não se importava em ficar sentada sozinha na cantina, de qualquer forma. Pelo menos isso lhe dava a chance de conversar secretamente com seu professor.
“Escute, Rain… Eu sei que matar pessoas é geralmente mal visto. Mas se você quer estrangular a desculpa esfarrapada de cozinheiro que eles têm no comando da cozinha do acampamento, eu não vou julgar…”
Rain levantou uma caneca, escondendo os lábios atrás dela, e respondeu calmamente:
“É algo que você deveria ensinar à sua aluna, professor? Como assassinar pessoas?”
Sua sombra permaneceu em silêncio por um tempo, então perguntou em tom confuso:
“Sim? O que há de errado com um pequeno assassinato?”
Rain exalou lentamente. 1
“Não vou matar o cozinheiro do acampamento, obrigada…”
Terminando sua refeição, ela saiu do refeitório e foi até o vagão de gerenciamento da equipe.
No caminho, Rain passou por uma equipe de cadáveres tranquilos que carregavam sacos de cascalho, mais uma vez sentindo como se tivesse acabado no inferno. Então, ela cruzou a seção finalizada da estrada e parou por alguns momentos, olhando para baixo. Um pequeno sorriso surgiu em seu rosto.
Rain se alistou como trabalhadora da equipe de estrada por necessidade, mas depois de passar algum tempo no acampamento errante… Ela percebeu que ele gostava muito daqui. Foi um pouco mágico, ver uma bela estrada aparecer do nada na terrível natureza selvagem do Reino dos Sonhos. Como assistir a ordem e o espírito humano triunfarem sobre o caos.
A estrada em si também era uma maravilha da engenharia.
O pai de Rain trabalhava para o governo, lidando com a logística complicada que o fazia funcionar. Ele raramente levava seu trabalho para casa, e ainda assim, ela tinha uma compreensão melhor de quão maravilhosa era a infraestrutura do mundo do que a maioria de seus colegas. Antes dos Tempos Sombrios, os humanos frequentemente admiravam as chamadas maravilhas do mundo — grandes estruturas que desafiavam a imaginação. No entanto, Rain era da opinião de que a maior coisa que a humanidade havia construído, de longe, raramente recebia qualquer atenção.
Era a rede de estradas que costumava conectar todas as cidades do mundo desperto, envolvendo-o como uma teia de aranha do tamanho de um planeta. A escala dela era quase insondável… e essa era apenas a escala física. O papel que ela desempenhava para a infraestrutura do mundo, a quantidade de bens e pessoas sendo transportadas por essas estradas todos os dias, era ainda mais inimaginável.
Claro, essa era já tinha acabado há muito tempo. A maior parte do mundo desperto havia sido perdida, e a maioria das estradas que os humanos construíram foram destruídas. Hoje em dia, restavam apenas algumas ferrovias reforçadas e rodovias facilmente defensáveis, conectando as cidades muradas da humanidade.
Eram cada vez menos usados a cada ano.
Foi por isso que Rain se sentiu feliz por ter se juntado ao acampamento de construção de estradas. A estrada estava sendo construída bem na frente dos seus olhos, e ela se viu profundamente animada com o processo de construção. A engenharia, a logística, a resolução de problemas… tudo isso era fascinante e maravilhoso. A larga estrada de paralelepípedos aparecendo como um resultado palpável e inegável de tudo isso era uma alegria de se ver. Construir coisas falava com algo enterrado profundamente em seu coração.
Era como se ela estivesse criando o núcleo da alma, um grão de areia de cada vez. Foi por isso que Raun passou todo o seu tempo livre, que não era muito grande, observando cada parte do processo de construção, desde a maneira como os trabalhadores eram gerenciados até a maneira como os mortos colocavam camadas de areia, cascalho e pedra britada na vala cavada antes que os sapateiros começassem a trabalhar.
Chegou ao ponto em que ela estava um pouco relutante em deixar o acampamento principal da construção para trás, mesmo que parecesse um inferno errante. No entanto…
Havia mais na construção de uma estrada do que simplesmente construí-la. As outras tarefas também faziam parte do processo. Então, ela estava curiosa sobre elas também. Aproveitando a sensação sólida das pedras pavimentadas sob suas botas, Rain atravessou a estrada imaculada e entrou na parte norte do acampamento. Era muito diferente do assentamento caótico onde os trabalhadores viviam. Aqui, as tendas eram muito maiores e mais luxuosas, e havia até mesmo algumas construções semipermanentes com paredes de madeira. Tudo parecia mais limpo e mais organizado.
Era lá que os Despertos e os gerentes viviam e trabalhavam.
O escritório de gerenciamento da tripulação era, na verdade, um vagão enorme com um prédio de madeira de dois andares construído nele. Quando o acampamento migrou, ele foi puxado ao longo da seção recém-construída da estrada por dois enormes Ecos, mas agora que o acampamento estava parado, o vagão estava simplesmente parado ali.
Rain respirou fundo.
‘Espero conseguir uma nova tarefa hoje!’
Ela estava bastante esperançosa.
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