Capítulo 299: Ragnarok (4)

Tradução: Nimsay

Estou sentado na grade lateral do convés do vazio navio de Mobius, bebendo água.

A grande batalha com Mobius estava chegando na fase final. Com a morte de Karacle a Supressão Forçada foi suspensa e a cadeia de comando entrou em colapso. O fato de que o Grupo Um, livre de suas dificuldades, começou a sair do controle também foi um fator importante.

‘Seria bom se tudo acabasse aqui.’

Joguei o cantil vazio para fora da embarcação1.

O número de tropas que nos invadiram era suficiente para esmagar facilmente vários jogadores de nível superior, mas era otimista demais pensar que esse seria o último ataque.

‘Se não terminarmos rápido… eles continuarão atacando.’

Como esta é uma batalha pelo controle de uma dimensão e universo, é inevitável que haja uma diferença na capacidade de resistência. Mesmo que Niflheim tenha conseguido defender este ataque, pode eventualmente colapsar.

Precisamos destruí-los antes disso.

Bum! Bum! Um enorme dirigível Mobius caiu em chamas bem próximo a mim.

Além do problema de Mobius, também não se sabe por quanto tempo o ‘computador’ principal do Servidor Um vai aguentar. Não seria estranho que os fragmentos liberados causassem estragos por todo o universo a qualquer momento.

‘A possibilidade de vitória é… uma corrida contra o tempo.’

Nesse momento, Ikar, a irmã mais nova de Tel, estava bloqueando a entrada dos fragmentos. Como o sistema defensivo de Mobius ainda não está perfeito, é o momento com maior probabilidade de sucesso.

Bem, primeiro, tudo deve ser limpo.

Gargalhei enquanto agitava minha capa. Logo depois, um círculo dourado foi apareceu, revelando a cena dentro da Sala de Espera de Taoni, que está uma bagunça.

Várias estruturas como o Centro de Treinamento, a Oficina, os Dormitórios e várias instalações de descanso foram completamente destruídas, e os coletores e artesãos, que não tinham capacidade de resistência, foram massacrados. Se Qlqr1 estivesse aqui, pelo menos teria dado uma ordem de evacuação, mas sua conta já estava suspensa. Esses cadáveres espalhados na praça devem ter morrido sem saber de nada.

— O que fazemos com os corpos?

— Não há como tratá-los. Reúna-os e queime-os.

— …Entendido.

Os heróis em uniformes de Niflheim estavam ocupados arrumando o lugar.

— Ugh! Ugh! Uuuuh!

Um menino estava caído no chão, vomitando. É compreensível, pois os corpos aqui estavam tão desfigurados que eram irreconhecíveis.

Olhei para o garoto antes de subir as escadas. Fui para o último andar da Sala de Espera, passando pelos heróis de Niflheim e Taoni que me olhavam estranhamente.

— Você chegou, irmãozão. — Jenna se levantou dos escombros de uma mansão destruída. Sua armadura de couro estava manchada de sangue e poeira. — Eu sabia que você viria se eu esperasse aqui.

— Está ferida?

— Estou bem. Embora eles tenham usado armas estranhas, tenho treinado com o irmãozão Vel. — Jenna sacudiu a poeira do traseiro e se aproximou de mim. Ela não conseguia esconder o cansaço no rosto, mas não aparentava ter ferimentos. — Mas, irmãozão, ouvi algo estranho da maga de Niflheim.

— Da maga…? Yurnet?

— Sim, acho que esse era o nome dela. Ela me disse de onde você veio, quem você é, o que é Taoni e o que são os fragmentos. Ela é uma mulher muito inteligente e disse que estamos destinados à destruição.

Então ela contou tudo a eles. Já que tínhamos chegado ao nonagésimo andar, era uma informação que seria revelada.

— Então… nós realmente estamos…?

— O que? Realmente acha que estamos destinados à destruição?

— Bom, depois o que vimos no nonagésimo andar…

— Por que acha isso?

— Ela disse que tudo o que fizemos foi inútil, que foi tudo em vão. Que devolver o irmãozão para onde ele pertence é o melhor que poderemos fazer…

— Não mesmo. Tudo que fazemos é relevante. Pelo menos, ainda estamos vivos, certo?

Jenna ficou em silêncio, olhando para mim. Quando ela pensava profundamente sobre algo, costumava fazer essa expressão.

Com os lábios franzidos, Jenna abruptamente falou: — Então, você ainda quer lutar, irmãozão?

Ela tem uma intuição aguçada, como uma coruja2.

Bom, nunca pensei que conseguiria enganar essa garota.

— Leve-me com você — Ela falou olhando para mim.

— Você não quer voltar para casa?

— Como posso voltar? Não tenho para onde ir.

— Você é muito fraca. Não seria nada além de um lanche para aquele cara.

— Talvez eu não seja párea para ele, mas pelo menos posso ser um incômodo! — Jenna falou estendendo o braço, mostrando um músculo inexistente. — Ei! Se vamos morrer, deveríamos pelo menos tentar alguma coisa. Nunca se sabe! Um milagre pode acontecer, e eu poderia despertar meu super potencial interior, derrotando os inimigos…

Paf. Segurei Jenna enquanto ela caía e a deitei no chão. Depois de pressionar seu ponto de acupuntura, ela dormirá profundamente por pelo menos um dia.

— Ela vai guardar rancor, veterano.

— Você acha que eu me importo? — Sorri e olhei para o lado, vendo Velkist sair de trás do prédio.

— Veterano… você mudou. Percebi só de te olhar.

— Como Jenna disse, meu super potencial despertou. Eles não têm chance.

— Seja qual for o resultado, será muito difícil para você.

— Eu não entendo o que você quer dizer.

— Quantos anos levará?

Eu franzi a testa, enquanto Velkist me olhava com uma expressão impassível, encostado na parede.

— Quantos anos?

— Não importa o quanto você tenha despertado um poder desconhecido, quantos anos levará para finalizar tudo isso?

— Vou descobrir tentando.

— Por que diz que vai tentar, mas sai como se estivesse fugindo?

— Velkist, você amadureceu.

— Graças a você, veterano — Velkist sorriu levemente. De repente, seus olhos ficaram frios. — É uma batalha eterna com inimigos infinitos?

— Parece até piada, mas definitivamente há um fim.

— Esse ‘fim’ pode ser julgado de uma perspectiva humana? Para nós, humanos, esse período de tempo seria eterno. Mas, mesmo que eu diga isso… não acho que posso mudar sua decisão — Velkist suspirou depois de falar. — Se você tiver algum pedido, diga-me.

— Quando eu começar esta batalha…

— Hum…?

— Taoni retornará a ser como era. Então, ajude Pria. Quando eu terminar com Mobius e entrar na fronteira, poderei restaurar Taoni. — Suspirei olhando para Jenna. — Eu não cortei sua conexão com Assinis, você terá poder suficiente. Até eu retornar, você será o sub-mestre de Taoni. Cuide bem de todos no meu lugar.

— Sério… você vai sozinho?

— Você viria comigo? — Sorri amplamente olhando para ele. — Você lutaria contra infinitos inimigos, por milhões de anos, por mim?

— …

— Explique tudo para Jenna. Adeus.

Eu me virei.

Ainda há muitos heróis que não vi.

Kishasha, a futura líder dos teriantropos, Kátio, que estará consertando as embarcações aéreas, e Weiryong, que reunirá as tropas de defesa Taoni para proteger a Sala de Espera. Mas, vou deixar as despedidas para depois3.

Não preciso passar pelos andares inferiores. Posso abrir um portal dimensional a qualquer momento.

Caminhei pela trilha que saía do jardim.

— Ah, a propósito, esqueci de dizer uma coisa — falei sem olhar para Velkist.

— … O que?

— Eu… definitivamente voltarei.

Não houve resposta. Sorri e segui em frente.

Então, virei à esquerda e entrei em um armazém solitário no último andar.

‘Abra.’

Empunhando a bainha Bifrost, um portal dimensional conectando-se ao exterior da torre foi criado.

[Loki!]

Isel apareceu em meio à poeira estelar. Ela carregava documentos grossos na cintura.

[Os resultados da investigação que você solicitou chegaram.]

— Tão eficiente. Eu gosto disso.

[A maioria dos cálculos já estava feita, só precisei imprimi-los.]

Peguei os documentos com Isel.

O pedido era simples. Estime o número de fragmentos e o tempo necessário para erradicá-los. A maioria dos dados já estava inserida, então a análise não demorou muito.

— Vamos ver.

Folheei rapidamente as páginas e vi o número nas últimas linhas do documento. 

Dois milhões e setecentos mil anos4.

[O que foi calculado aqui? Só vejo um monte de números.]

— Isso? Foi só uma brincadeira.

Joguei os documentos e uma chama negra os consumiu completamente.

‘Primeiro, preciso ir para o Servidor Um.’

Restam trinta e dois diretores na sede, começarei absorvendo todos os dados deles.

Agarrei firmemente a bainha no meu cinto e pisei no portal dimensional.

Fora da torre, destroços de embarcações aéreas destruídas flutuavam por toda parte. Puxei um que parecia intacto com telecinese e desci no convés.

Injetando força de interferência, as peças danificadas foram reparadas e o combustível foi reabastecido.

‘Inserir as coordenadas.’

Eu já conheço a entrada do Servidor Um.

Vrum! Chamas saíram da popa do dirigível enquanto ele era ligado.

[Uhhh…]

— Se está com medo, pode ficar.

[Não, eu vou com você! Eu vou com você!]

Isel balançou a cabeça e subiu no meu ombro.

Ao chutar levemente o convés, o dirigível começou a se mover.

‘Acelere.’

Vruuum! O dirigível acelerou, planando entre as nuvens.

Agora que penso nisso, não dei nome ao dirigível. Não precisei pensar muito pois o nome  veio a mim em um segundo.

‘Qualquer Um5’

Me pergunto o que a Mestra está fazendo agora. Talvez ela tenha se cansado desse jogo lixo e o tenha deletado. Ou talvez esteja tentando desesperadamente recuperar sua conta no atendimento ao cliente.

Seja como for…

— Por favor, tente mais uma vez.

Vrum! O Qualquer Um avançou rapidamente em direção à borda do campo.

< Mestre! >

Olhei para o lado e vi uma projeção aparecendo com uma voz urgente. Obviamente era Yurnet.

< Pare imediatamente! >

— …

< Se você decidiu lutar, não precisa retornar à Terra. Mas, mas desse jeito… você vai nos …! >

Estalei meu dedo direito e a projeção de Yurnet desapareceu como névoa.

Bum! Olhando para trás, vi que Seris estava saltando entre os dirigíveis em nossa direção com uma velocidade que lembrava a de um avião a jato.

— Ah.

‘Ela já descobriu?’

Acelerei mais o dirigível. Com energia máxima, o dirigível avançou rapidamente.

[Loki… Eu não conheço bem a situação, mas… você não deveria falar com eles?]

— Não há muito a dizer.

Eles gritaram comigo da última vez que nos vimos. Disseram que eu preciso retornar ao planeta Terra, entregar o Livro que Desafia os Céus e que eu fui arrogante.

‘Não é que não tenham sido úteis.’

Sem eles, eu teria que percorrer um caminho muito mais longo. E poderia ter sido destruído sem saber de nada, sendo usado por Tell.

— E seria tedioso.

Eu odeio melodramas cafonas e posso prever como diriam e agiriam, tentando me controlar. 

Desde que eu era o Mestre, ela sempre interferiu em tudo que eu fazia. Se não tivesse sido invocada com quatro estrelas, já a teria substituído há muito tempo.

— …!

Os lábios de Seris estavam se movendo. Ela deve estar dizendo alguma coisa, mas não consigo ouvir de longe. 

E nem tenho intenção de ouvir.

Sreung. Desembainhei Bifrost, que foi feita em uma colaboração minha com Yurnet. Com durabilidade quase infinita6 e efeitos variados, foi muito útil em minhas missões.

[Loki! Tem uma barreira à nossa frente! Vamos bater!]

Isel estava pálida de medo.

Chegamos à beira do campo antes que eu percebesse. Parecia não ter fim, mas em um ponto há uma parede invisível.

[Vamos bater! O dirigível vai…!]

Um brilho dourado envolveu a embarcação aérea. O Qualquer Um, que deveria ter sido destruído, passou suavemente pela parede.

[Huh?]

Isel ficou abismada.

Sorri e chutei o chão. O dirigível que avançava rapidamente parou de repente.

Com um estrondo, Seris bateu na barreira. Ela foi imediatamente jogada para trás, mas rapidamente sacou Lævateinn e começou a bater na parede invisível.

Embora o fogo de Seris fosse quase invencível, ele não conseguia quebrar as regras do sistema. O fogo apenas aqueceu a barreira inutilmente.

— …! — Ela gritava desesperadamente, mas não conseguia ser ouvida.

‘Dois milhões de anos.’

Convertido para dias, são novecentos e oitenta e cinco milhões e quinhentos mil dias. Em horas, era um número difícil de imaginar.

— Não vou ficar entediado.

Joguei Bifrost para o alto.

A grande espada preta, envolta em energia azul, parou no ar.

— Selo Celestial e Terrestre.

Uma técnica secreta da Rainha Alada Azul, Shutenberg. Essa barreira pode fixar o espaço-tempo de uma área. Embora não dure muito, me dará o tempo necessário.

Bifrost voou rapidamente e se fincou na parede invisível, fazendo uma chama azul se espalhar pela barreira a partir da lâmina.

Peguei a bainha do meu cinto e a joguei por cima do corrimão. Não precisarei mais desta espada.

— Seris.

— … — Ela parou de se mover, olhando para mim.

— Com isso, estamos quites.

‘Salto dimensional.’

Uma luz ofuscante envolveu minha visão.