Capítulo 293: A Encarnação (1)

Tradução: Nimsay

Respirei fundo. Minhas têmporas latejavam com uma dor aguda e meu estômago estava embrulhado, mas me forcei a segurar.

A ascensão de sete estrelas ainda estava em andamento.

— Relaxe…

Não importa o quanto eu tentasse pensar com clareza, era difícil aceitar a verdade. 

Claro, não era impossível para Han Israt ser membro da realeza de Taoni. Houve indícios ao longo das missões e, observando cenas das ascensões anteriores e as palavras de Pria, era algo que podia ser antecipado.

‘Mas isso…’

Saí para o terraço, pois precisava de tempo para clarear minha mente.

Naquele momento, uma brisa fresca soprou. Sentei-me em uma cadeira de ferro ao lado da mesa e comecei a rever tudo lentamente.

‘Se eu assumir que o que acabei de ver é verdade…’

Significa que sou originalmente de Taoni e que Pria me enviou para o planeta Terra. 

Era natural que eu tivesse crescido como órfão e não tivesse conseguido encontrar meus pais ou família. Eles não estavam lá desde o começo.

— Hahahahaha. — Uma risada sarcástica escapou dos meus lábios.

Era como assistir a um filme sem coerência, sem um pingo de realismo. Basicamente jogaram na minha cara que essa é minha verdadeira identidade e isso só me deixou com uma sensação de vazio.

— Que ridículo.

Eu tinha sido enganado do começo ao fim?

Franzi a testa e cocei o pescoço. Não tinha ideia do que fazer. Apenas as folhas carregadas pelo vento se acumulavam no chão do terraço.

— Pria.

Virei a cabeça. No corredor além do terraço, Pria, em seu traje formal, estava saindo do quarto.

Ela provavelmente está indo para a sala de reunião. Lá, o príncipe e os líderes de várias tribos estariam em um debate acalorado.

— Você… sabia disso.

Antes de morrer, ela me pediu para sorrir para ela uma vez. Ela não teria dito algo assim se não soubesse toda a verdade.

— Desde quando você sabia?

Não foi difícil chegar à conclusão.

No septuagésimo sexto andar, quando Pria estava no palácio e o príncipe estava brincando com ela, ele a fez lembrar à força de suas memórias de vida.

‘Foi naquele momento… Ela percebeu.’

Foi por isso que ela se vestiu daquela maneira arrumada? Porque ela queria me dizer isso?

Foi também nesse ponto que cancelou nosso contrato.

‘Se eu não tivesse vindo para Taoni, você não teria conseguido me reconhecer?’

O rosto de Pria, sorrindo alegremente, apareceu em minha mente.

Bem, se você pensar bem, ela não estava totalmente errada.

‘Você pode esquecer a promessa que fizemos antes. Faça o que a missão permite e volte para casa. Encontre sua felicidade lá.’

Como se estivesse reproduzindo uma lista de música em um dispositivo MP3 ¹, as palavras de Pria voltaram uma por uma.

‘Não me arrependo. Minha luta não foi em vão. Tudo fez sentido, desde o momento em que te conheci até esse fim iminente.’

Até mesmo seu último desejo.

“Só uma vez, mostre-me seu sorriso.”

Achei que a mudança de atitude dela tinha sido repentina, mas tudo tinha um motivo.

Que astuto.

Han Israt, o herói com uma estrela de Taoni, não era nada mais que uma criança insignificante de dez anos. E na Terra, eu era um jovem órfão de vinte e poucos anos.

Uma combinação totalmente incompatível. Da altura à constituição física, não havia nada em comum. Ninguém pensaria que éramos a mesma pessoa. Não é de se espantar que Isel tenha ficado confusa.

— Eu estar entendendo isso é loucura…

Ainda assim, não consigo aceitar.

Respirei profundamente várias vezes.

O que devo fazer? O fato de ser originalmente de Taoni, o fato de que tudo em que eu acreditava era mentira, não mudou a situação.

Uma vez que a ascensão acabasse, eu não teria escolha a não ser retornar à Terra. Lá fora, eles já estariam criando um portal dimensional.

Tudo isso era apenas o passado.

‘Não teve nada a ver comigo. Eu não sou Han Israt. Posso ter sido chamado assim no passado, mas Han Israt já está morto. Agora eu sou… Han Seojin.’

Em Mobius, me chamam de Loki.

Levantei-me da cadeira.

‘Nada mudou.’

Não importa qual seja minha verdadeira identidade ou quem eu era. O autor desta cena provavelmente esperava que, ao descobrir a verdade, eu desabaria e choraria, mas foi um erro patético.

— Foi um ótimo entretenimento. — Sorri ironicamente. — Dou um de dez como nota.

Minha tarefa aqui estava concluída.

Fechei os olhos e respirei fundo.

E quando os abri novamente, um grande choque me abalou.

Vi as paredes e os azulejos de metal familiares. Eu tinha retornado à Centro de Fomento na Sala de Espera. 

O desenho do círculo mágico, emitindo um brilho intenso, estava desaparecendo.

— Mestre, parabéns pela sua ascensão. — Como uma sombra, Nisled apareceu do nada e se curvou diante de mim. Atrás dela, o espaço distorcido formava um vórtice. — O portal dimensional com as coordenadas do planeta Terra já está completo. Você pode entrar quando estiver pronto.

— O que devo fazer para me preparar?

— Depois de obter o poder das sete estrelas…

— Ainda não sou um sete estrelas.

Dei de ombros e vi Nisled hesitar.

— O que… o que você quer dizer com isso?

— A ascensão falhou. Parece que Yurnet me deu um produto com defeito.

— Mentiras não funcionam, Mestre. — Os olhos de Nisled escureceram. Sua mão direita já estava no punho da adaga em seu cinto. — De acordo com os cálculos de Yurnet, com esta cerimônia, você deve ter ganho poder de interferência suficiente para suportar a pressão dimensional…

— Parece que estou mentindo?

Olhei para o lado.

Embora a ascensão tenha terminado, nenhuma mensagem de sucesso apareceu.

Por outro lado, a interferência de Tell parece ter aumentado consideravelmente e estava usando trapaças descaradamente, adicionado penalidades mortais aos heróis e concedido bônus absurdos aos combatentes da Mobius.

‘…Que patético.’

Ela parece ter um desejo insaciável.

Não bastou forçar a suspensão da conta de Qlqr1 e intervir, agora ela também estava ajustando códigos internos. Ela realmente me quer tanto assim?

— Espere, deixe-me verificar…

— Vá em frente. — Levantei minhas mãos. Nisled começou a dar tapinhas em meu corpo com movimentos cautelosos. Por fim, seus olhos se arregalaram. — Agora você acredita em mim? Não aconteceu nada.

— Isso é…

Eu não estava mentindo, não houve qualquer mudança no meu corpo.

— Vou falar com Yurnet. Espere um momento…

— Não há necessidade de tanto incomodo.

De repente, o espaço ao lado do altar se distorceu e alguém apareceu.

Uma garota de cabelos pretos elegantemente vestida em um terno. Tell sorriu e se aproximou de mim.

— Parabéns pela sua ascensão, Han.

Nisled sacou sua adaga em um instante e tentou cortar a garganta de Tell, mas ela foi derrubada sem qualquer explicação.

— Ugh…!

— Você parece não saber o seu lugar, pequena barata. — Tell apertou fortemente o pescoço de Nisled com o pé e um gemido estrangulado escapou dos lábios da mulher. — Nem tente intervir. Você deve saber quando é hora de sair.

Com um simples chute, Tell fez Nisled voar vários metros, batendo na parede com um estrondo.

Nisled caiu no chão, inconsciente. Embora ainda estivesse viva, ela não se levantaria por um tempo.

Estalei a língua e olhei para Tell.

— Como você entrou?

— Você achou que eu não conseguiria? Eu sou a governante deste jogo. Se eu quiser, posso ir a qualquer lugar — Tell riu. Ela parecia de bom humor, com suas bochechas brancas coradas, se aproximou de mim com passos leves e agarrou meu braço. — O que você achou, Han? Surpreendente, certo? A revelação impressionante do seu nascimento! Se isso fosse uma novela, seria um sucesso garantido!

— Provavelmente receberia muitas críticas e fracassaria.

— A crítica faz parte do charme! — Depois de falar, Tell caiu na gargalhada.

— Você sabia desde o começo?

— Claro que não. Eu não sei tudo sobre as bilhões de dimensões. Originalmente… você deveria ter se fundido com Seris e morrido como material para uma ascensão para sete estrelas. — Os olhos de Tell se estreitaram quando percebeu que eu ia falar algo. — Você realmente acha que um simples herói teria um Direito de Veto? A regra das sete estrelas era uma lei desde o início do jogo. É uma execução obrigatória. Se as condições forem atendidas, ninguém pode evitá-la. Mas uma anomalia ocorreu. Um milagre. Sim… ha, ha, ha! Ha, ha, ha! — Tell riu histericamente, ao ponto de até chorar. — Um acidente. Algo completamente inesperado…

— …

— Pense logicamente. Você acha que eu jogaria um material tão valioso quanto você em uma conta suja como a de Taoni? E se você morresse?

Tell enxugou as lágrimas dos olhos.

‘Bem, isso faz sentido que isso não seja lógico.’

Fui trazido para o jogo para superar a torre. Se tivessem me deixado em paz, Niflheim teria limpado o nonagésimo andar sem problemas.

‘Um acidente.’

Era compreensível que ela estivesse surpresa.

Eles planejaram me usar para a síntese de um sete estrelas, mas, em vez disso, acabei em um mundo completamente estranho. 

‘É por isso que eles contaram essas mentiras desajeitadas.’

Tudo finalmente se encaixou.

— Loki, você é a criação que eu estava procurando. Um produto de coincidências e milagres acumulados. Um presente do universo para mim! — Tell continuou falando com um sorriso encantador. — Você sabe por que os heróis de Niflheim são tão fortes? Por que um simples usuário como você pode criar uma obra-prima absoluta com métodos insignificantes como quebra-cabeças? Você realmente acha que conseguiu tudo isso apenas com sua habilidade?

— …

— Foi tudo uma trapaça. Você acha que o time que equilibra o jogo foi feito só para enfeitar? Esses truques são proibidos. Você não deveria conseguir fazer tudo isso só com sua habilidade. Mas você quebrou essa regra. — Os olhos de Tell se estreitaram e uma luz sinistra brilhou profundamente em suas pupilas. — Você é um humano de uma dimensão superior e, ao mesmo tempo, de uma dimensão inferior. Um ser que não deveria existir. Uma contradição que o universo não deveria permitir.

— …

— Loki, se você estiver comigo… podemos refazer esse jogo do começo. Mais completo. Mais perfeito. Agora você deve perceber quem você realmente é.

— Você está dizendo que eu tenho um poder especial?

— Exatamente. — Ela falou. Toda atenção de Tell estava em mim. — Dessa vez eu prometo a você, com toda a minha força, eu vou reviver essa Mobius. Você não quer salvar sua família também?

— Posso fazer isso?

— Sim, você pode. Até mesmo mudar o destino do universo.

— Essas são ótimas notícias.

— Ha, ha! Então é um acordo? Vamos abandonar essa luta idiota e ir para o servidor um imediatamente…

O pescoço fino dela torceu-se na direção oposta. O corpo de Tell tremeu, caindo no chão sem forças.

「Ha, ha… o que é isso…?」

O corpo de Tell, com a cabeça virada cento e oitenta graus, tremia.

— Obrigado pela informação. Ela resolveu minha curiosidade. — Sorri e me espreguicei.

「Eu não esperava… uma recepção tão boa.」

— Você disse que eu conseguiria, não é?

「Sim, você pode… sem dúvida…」

— Eu sou quem pode, não você.

「Do que você está falando…?」

Apertei a cabeça de Tell com minha mão e sussurrei em seu ouvido.

— Você ainda não entendeu? Você não é necessária.

Aplicando força com meus dedos, a cabeça de Tell foi esmagada com uma sensação de resistência. 

Levantei-me e sacudi meu pulso, jogando fora os fragmentos de carne e sangue escuro que estavam grudados.

O corpo de Tell, ainda tremendo, logo desapareceu na luz.

— Mestre, o quê…? — Nisled cambaleou e ficou de pé.

— Sinto muito, mas parece que tenho algo para fazer antes de retornar.

— Minha ordem é mandá-lo de volta para a Terra…

— Diga a Seris para ir catar coquinho.

Estendi minha mão direita.

— Isel.

Uma poeira estrelar brilhou e se dispersou, e uma pequena fada do tamanho do meu braço apareceu.

[Ah!]

Isel balançou a cabeça.

Como esperado, ela estava lá. Afinal, para onde mais ela poderia ter ido? Esta pequena criatura estava escondida em seu quarto enquanto Niflheim ocupava a Sala de Espera.

[Loki, o que você fez com a representante! Você pode morrer!]

— O que você acha que eu deveria ter feito? Rastejar? 

[Bem, isso também é… um pouco…]

— De qualquer forma, me dê. — Estendi minha mão para Isel.

[Dar o quê…? Ah!]

Entendendo o que eu queria dizer, Isel juntou as mãos. Ela desapareceu girando e voltou com alguma coisa.

[Aqui está!]

— Bom trabalho.

Coloquei o presente que El Cid me deixou na palma da minha mão.

‘O Livro que Desafia os Céus.’

O livro, que originalmente era apenas um pedaço de lixo gasto, emitia um brilho deslumbrante como nunca antes.

1. Pra quem não é velho o suficiente, dispositivos MP3 é onde estávamos músicas nos anos 2000 a 2010.[↩]