Capítulo 311: Fogo Residual (1)
Tradução: Nimsay
Seris Argentheim abriu os olhos vendo um céu cheio de neblina.
— …
Um campo se estendia ao seu redor, tingido de cinza.
No momento em que viu uma mulher deitada no campo, Seris sentiu que aquele lugar era um sonho. Ela sempre tinha esse pesadelo quando estava em mau estado.
‘Aqui de novo?’
Seris deu um sorriso amargo. Quando o pesadelo começa, não há como pará-lo. Não havia outra escolha a não ser assistir até o final.
— Cof… cof! — A mulher tossiu violentamente. Cada vez que ela fazia isso, o sangue transbordava e manchava seu peito com uma armadura de couro rasgada e despedaçada.
O cabelo loiro que costumava ser limpo e pele branca agora suja de sangue e poeira.
‘Aquela mulher… sou eu.’
Mais precisamente, antes de fazer um ‘pacto’ com a deusa. O cenário pouco antes da destruição de Niflheimr, a terra da neblina1.
— Kihehek! — Uma risada soou como se estivesse com a garganta cheia de catarro. Um homem estava em pé na frente da mulher caída. Tatuagens cobriam todo o seu corpo, sua pele era cinza-clara e ele tinha chifres em ambos os lados da testa.
‘São os Demônios Brancos.’
Eles eram os governantes que dominavam toda Niflheimr.
Com habilidades físicas superiores às dos humanos, uma natureza feroz e uma capacidade reprodutiva semelhante à dos ratos, eles criaram raízes por todo o continente, eventualmente dominando todas as raças da região.
Os humanos eram meros subordinados naquele lugar. Não, eles eram algo ainda mais baixo.
‘Eram a comida.’
O principal alimento dos Demônios Brancos era carne humana.
— Você realmente achou que alguém como você poderia me derrotar?
O homem com chifres esmagou a espada no chão com o pé. Uma velha espada de ferro que Seris obteve com grande dificuldade depois de anos. Só de pisar nela, a espada de ferro quebrou-se em duas.
— Você é fraca, ignorante e lenta. Você não sabe o que é honra. Humanos apenas deveriam respirar de tão lixo que são. Nascidos apenas para morrer em nossas mãos, como insetos.
Seris não conseguiu refutar no passado. Ela apenas olhou para o homem à sua frente com olhos trêmulos.
‘Aquele homem era o assassino do pai dela.’
Ele o havia despedaçado por puro tédio.
Seris tentou vingá-lo em meio ao caos quando algumas criaturas desconhecidas atacaram sua aldeia, mas ela falhou.
— Você achou que, porque algumas criaturas atacaram, o mundo acabaria? Vingança? Kihaha! — Bam! O homem chutou a mulher que vomitou sangue e rolou várias vezes. — O que é essa esgrima? Uma imitação de um cavaleiro? Você é apenas um porca vulgar.
— Aaaah… — Apenas um suspiro áspero escapou de sua boca.
O homem sacou uma adaga enquanto esticava sua longa língua de serpente.
— Por onde devo começar a te despedaçar?
— …!
— Deixe-me ouvir seus doces gritos. Eu não mato minha presa facilmente. Houve momentos em que viveram até serem esfolados dez mil vezes. — A adaga afiada tocou sua coxa e os olhos da mulher se encheram de terror. — Primeiro, cortarei sua coxa macia. Depois a panturrilha. Depois disso, as nádegas. Enquanto ouço você gritar… saborearei sua carne fresca.
A lâmina afundou levemente em sua coxa e justo quando estava prestes a rasgar a pele…
— … Pare! — Ela gritou, chorando.
— O que você disse?
— Por favor… pare… eu… estava errada…
— Você fala informalmente.
— Eu… estava errada… — Lágrimas rolaram pelos seus olhos.
— Implorando pela sua vida ao assassino do seu pai?
Seris fechou os olhos enquanto olhava para seu antigo eu. Mesmo assim, o pesadelo continuou.
— Repita. O que você disse?
— Por favor me perdoe…
— Sua atitude não está certa. Você deve se ajoelhar.
Ela rapidamente adotou a posição, ajoelhando-se. Seus joelhos sangravam enquanto eles cavavam nas pedras, mas ela não se importava.
— Prostre-se, gado.
Ela se prostrou. O homem sorriu satisfeito e colocou o pé no cabelo desgrenhado dela.
— Vingança pelo seu pai? Você queria ser uma cavaleira?
— Não…
— Humanos não têm honra. Eles não têm uma civilização superior ou um deus para servir. Se dissermos morra, eles morrem, se dissermos viva, eles vivem. São porcos, lixo como insetos. Mas esse lixo… ousou levantar a mão contra mim…?
O homem pisou na cabeça dela com força. Ela tremia e não conseguia se mover.
— Eu decidi, humana. Vou oferecer você como um sacrifício para nossa deusa. Eu precisava de um coração humano fresco.
— Não, não!
— Relaxe. Você morrerá rapidamente quando eles arrancarem seu coração vivo.
Seus olhos se encheram de desespero.
‘Que horrível.’
Seris mordeu os lábios enquanto observava sua antiga eu. Aquela mulher cedeu ao medo quando sua vingança falhou.
‘Sem honra.’
Era natural, os humanos aqui não receberam educação. Eles foram criados como gado para serem comidos pelos Demônios Brancos.
Às vezes para ser comido. Às vezes para ser apreciado. Às vezes como escudos de carne em suas disputas territoriais.
‘Niflheimr.’
Uma terra sem esperança. O continente onde ela vivia ficava envolto em neblina o ano todo, dificultando a visibilidade, já que mais da metade do ano era inverno e o clima era implacavelmente desolado.
‘Um inferno.’
Os humanos aqui nasceram para morrer.
‘Ela não conseguia entender.’
O que era amizade, amor, camaradagem. Naquela época, ela não conseguia compreender como era estar viva.
Uma existência semelhante à do gado.
As palavras do homem eram verdadeiras, a vingança de Seris foi apenas uma imitação grosseira. Seu pai costumava lhe contar histórias sobre cavaleiros.
Os cavaleiros nas histórias eram majestosos, honrados e belos. Fascinado por essas histórias, Seris havia planejado uma vingança fútil.
— Por favor, me perdoe…!
— Kihahaha! Hahaha! — O homem arrastou Seris em direção ao templo das deusas gêmeas, não muito longe do campo. Lá ele planejou oferecê-la como um sacrifício vivo. — Seu coração fará a deusa feliz. Considere isso uma honra! Nem todos têm essa oportunidade. Você, pelo futuro da nossa grande raça…
「Eu não disse que não precisávamos de sacrifícios?」
O homem parou. Não muito longe, uma jovem garota estava olhando para ele.
— O quê? O que uma porca está fazendo aqui…?
「Parece que eles chamam os humanos de porcos aqui. Antigamente, Niflheimr era um dos lugares mais proeminentes em Mobius. A terra do fogo eterno decaiu bastante.」
A jovem sorriu levemente e se aproximou do homem. Seus olhos estavam cheios de veias.
— Você quer morrer…?
「Feche os olhos se não quiser morrer.」
Os olhos da jovem emitiam uma luz arrepiante. O homem tremeu ao se levantar e de repente se prostrou diante dela.
— Não pode ser…! Senhora Hela!
「Meu nome é Hela aqui?」
— Sim, deusa! O que te traz a este lugar humilde!
「Resumindo, seu mundo está condenado. Em uma semana, no máximo, os Ceifadores chegarão ao continente. Vocês não serão capazes de pará-los. Suas forças são patéticas e vocês não estão unidos. Em suma, um mundo lixo.」
— O que você quer dizer…?
「Você não recebeu o oráculo? Eu disse que você tinha que fazer um pacto comigo se quisesse salvar o mundo. Esse é o trabalho dos seus heróis, não é?」
O homem piscou.
A jovem, chamada deusa, sorriu com desdém.
「Eu vim ver o Sacerdote, mas ele nem era digno de ser chamado de herói. Parece que sua força é maior que a dos humanos… mas sua civilização é primitiva.」
— Deusa! O quê…!
Bam! A cabeça do homem com chifres voou pelo ar. Sangue azul jorrou de seu pescoço decepado.
— Ah! — A mulher deu um passo para trás aterrorizada. Os olhos da jovem se voltaram para ela.
「…Uma estrela.」
A jovem murmurou brevemente.
「No máximo, duas estrelas. Com sorte, três estrelas. Nenhum talento. Este mundo já está morto. É melhor descartá-la.」
— Quem é você…?
「Parece que você não recebeu educação. Todos os humanos aqui são tão primitivos?」
A jovem garota na sua frente não era uma existência comum. Seris, em seu presente, sabia muito bem a identidade da jovem.
‘A deusa da compaixão.’
A presidenta da Mobius, empresa que criou o Escolha-me!, e representante do Panteão. Em Taoni, onde o mestre de Seris, Loki, residia, eles a chamavam de ‘Tell’.
「Pensei em algo interessante.」
De repente, a jovem sorriu, como se tivesse encontrado um brinquedo divertido.
「Se há vencedores, também deve haver perdedores. Não seria ruim ter algumas armadilhas misturadas aqui e ali. Para a facção dos heróis… sim! Eu usarei vocês, os humanos. Vocês serão capazes de vingar os Demônios Brancos que os oprimiram.」
— …O que?
「Eu te darei uma chance de vingança. Eu poderia te transformar em monstro, mas a diferença de poder seria muito grande. Seria como uma luta entre um coelho e um leão. Não seria um jogo.」
A mulher não entendeu as palavras da deusa. Coisas sobre jogos e coisas assim, em sua ignorância, ela não conseguia compreender.
Ela apenas piscou com seus olhos esmeralda.
「Ha! Huhahaha! Isso vai ser divertido. Eu me pergunto qual mestre infeliz terá que lidar com você. Quem poderia liderar essas criaturas meio formadas… e enfrentar missões infernais? Estou ansioso por isso. E você?」
— …
「Ah, certo. Vou te dar um favor extra. Até mesmo uma conta lixo deve ter pelo menos um herói de alto escalão. Para ganhar algum dinheiro, deve haver um mínimo de respeito. Vamos ver, quatro estrelas deve ser suficiente. Com um pequeno truque na janela de status, deve funcionar.」
A mulher deu um passo para trás.
Embora não entendesse as palavras, ela podia sentir que a jovem tinha intenções maliciosas.
「Venha aqui, minha filha.」
— Não, eu não quero…
「Por que não? Estou lhe oferecendo a chance de ser uma heroína de quatro estrelas. Em outros mundos, você não obtém uma classificação tão alta sem ser alguém importante.」
— Fique longe de mim!
「Desde quando o gado tem o direito de recusar?」
Os pés dela pararam. A jovem se aproximou lentamente dela e sussurrou.
— Qual o seu nome?
— Qua… Quarenta e sete…
「Um número?」
— O papai… me chamava… de Seris…
「Tudo bem, senhorita Seris. Imagino que você não tenha um sobrenome. Vou te dar um legal. Que tal Argentheim? Parece legal, certo? Sua classe inicial será cavaleira. É uma classe importante.」
— Cavaleira…
「É uma classe que vive e morre pela honra. Acho que você vai gostar. Embora, é claro, você seja apenas um lixo pela metade. Eu vi como você rastejou como um inseto, implorando por sua vida.」
— …
「Eu me pergunto que mestre infeliz vai te pegar. Se fosse eu, te usaria algumas vezes e depois te descartaria. Tente não ser sintetizada. Hahaha!」
A jovem caiu na gargalhada incontrolável.
「Isso é ridículo! Ninguém pode usar essa conta! É lixo entre lixo, um inseto entre insetos. Que mestre poderia superar tais condições? Se isso fosse possível… Eu o chamaria de deus2! Ahaha! Hahahaha!」
O pesadelo sempre terminava da mesma maneira, com o riso da jovem.
— …Ah.
Seris abriu os olhos e reconheceu o teto familiar. Está no décimo terceiro andar de Niflheimr, seu dormitório.
‘Mais uma vez.’
Ela não sabia quantas vezes isso tinha acontecido. Desde que o mestre foi embora, Seris tem tido esse pesadelo todas as noites.
Ela bebeu a água do copo ao lado da cama em um só gole. A água fria escorrendo pela sua garganta clareou sua mente consideravelmente.
Eita, que passado… Trauma é pouco para o pessoal de Niflheimr 😀
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