Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.
De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!
Capítulo 160: Silêncio
O silêncio abraçou Liane, imergindo-o num oceano mudo sem luz. Ele afundou para as profundezas, apenas para ver alguma coisa presa ao fundo por correntes metálicas, envolvendo aquilo que parecia ser uma massa amorfa de piche. O ser, mesmo cheio de dentes e olhos ao longo do corpo, estava quieto, congelado no tempo e movendo os orbes lentamente de um lado para o outro, enquanto as bocas mexiam em sintonia para respirar.
Eles se encontraram frente a frente. Era estranho, pareciam tão próximos e simultaneamente distantes, se conheciam há tanto tempo e ainda assim não era o bastante para fechar um abismo entre suas mentes. Uma força invisível impediu Liane de se aproximar, empurrando-o para longe. Só assim viu como as correntes possuíam símbolos percorrendo os nós de ferro.
A criatura, seja lá o que fosse, parecia sofrer, às vezes se debatendo como forma de se libertar daquela prisão, mas sem sucesso.
— Lia… neee…
Sua voz fraca foi a última coisa que o garoto ouviu antes de ser abruptamente puxado de volta a superfície do oceano. Abriu os olhos, dando de cara com um teto distante e branco, os arredores embaçados e o pescoço dolorido, junto dos ossos e músculos cujo peso assimilava-se a dezenas de milhares de espadas de madeira. Nada mexia, uma faixa envolvia a garganta e as mãos pareciam coladas a cama.
— Erika?
Nada respondeu ao chamado.
— Erika, você está aí?
O ambiente sem movimento criou paranoias a mente de Liane. A entidade não falava, e ele ergueu o tronco de uma vez, mesmo que doesse muito ao corpo. Estava dentro de uma das salas de enfermaria da catedral, mais especificamente num cômodo separado dos demais, reservado a figuras influentes da igreja e para pessoas importantíssimas. Uma ardência apareceu pouco acima do peito, e quando olhou para baixo, notou uma cicatriz escondida pela faixa.
As memórias retornaram numa torrente, o exato momento em que “morreu”. Ainda era uma sensação vívida, um momento gravado no âmago e eternizado no trauma. Pôs os pés para fora da cama, quase caindo para o lado quando saiu. Aquela falta de som, de um barulho constante na mente, começou a incomodar.
— Erika, não brinca comigo, eu sei que você tá por perto…
O silêncio continuou. Liane largou os lençóis e puxou uma cortina dividindo-o do restante da sala, sequer uma alma viva o esperava, nem Celine, nem Jessia, Grey, Vylon, Zana ou Er’Ika. Somente a solidão acompanhou seus passos vacilantes, enquanto uma marca profunda era cravada na consciência.
— Erika, por favor…
Lágrimas apareceram no rosto. Ninguém viria para ajudá-lo, era só a sua mente vagueando de um pensamento para o outro em busca de uma resposta inexistente. Ele chorou, chorou como sempre fazia quando o mundo virava as costas e o jogava para a sarjeta, o ciclo se repetiu mais uma vez. Outra pessoa desapareceu de sua vida tão rápido quanto entrou, aquele ser tão estranho, rabugento e narcisista que conseguia resolver qualquer situação com pouco esforço.
Era quem manteve companhia, com quem brigou, com quem riu e com quem descobriu tantas surpresas. Talvez havia se apegado a pessoa errada, pois agora desejava com todo o coração que a entidade retornasse, usando alguma brincadeira de mal-gosto para surpreendê-lo. Uma pena que isso nunca veio, Er’Ika sequer mostrou a presença por meio de uma reclamação como era costumeiro.
A realidade caiu sobre si. A entidade com quem passou tantas provações desapareceu. Ele não sentia também a sua influência pelo corpo, quando tentou evocar um relâmpago, pequenas faíscas apareceram antes de desaparecerem. Quando adormecia um membro, nada o controlava, virava um pedaço molenga sem vida. Nada habitava sua mente.
Um clique veio da porta. Batidas no piso ecoaram para dentro do cômodo, indicando a presença de uma moça. Liane deu um passo para trás assim que viu sua silhueta, cabelo loiro e olhos esverdeados sem vida, com robes brancos adornando sua aparência quase perfeita de uma santa. No entanto, a aura que transmitia era diferente, a de pena e simultaneamente cheia de um espírito maquinado, desprovido de vitalidade.
O garoto também não conseguia mais sentir energia divina e nem demoníaca, logo, não soube discernir quem era aquela moça de primeira, seu medo o fez recuar. A mulher, por outro lado, pouco se importou, pegando-o pelo pulso e puxando para fora da sala.
— Pa-Para! Que-Quem é você? Pra onde tá me levando?!
Zero explicações foram dadas, nada impedia as vontades daquela santa de fazer o que bem entendesse. A catedral estava completamente vazia, fiel algum a impediria de realizar o que devia ser feito. Ela o trouxe para o hall principal, onde a estátua de Lithia olhava para seus seguidores com um sentimento ameno, enquanto outras figuras estavam dispostas pela sala.
Entre elas, o bispo Vylon, Jessia e o paladino Grey. Liane os olhou, pedindo por ajuda nas lágrimas escorrendo através das bochechas, mas não se moveram um passo. O menino foi colocado à frente da estátua, enquanto outras santas e paladinos rodearam-no em uma formação circular, elevando uma barreira protetora de poder divino.
Ele tentou sair dali, mas já era tarde demais, os seus punhos encolheram de volta ao tocarem a barreira ardente.
— O-O que tá acontecendo…? Jessia, Grey…
Os dois quem chamara mostravam expressões complicadas, mas estavam tão congelados quanto estátuas. Quanto a santa Cristal, ela bateu seu cetro no chão, e em sincronia cada um dos fieis ao redor reforçaram o círculo.
— Comecem o ritual de selamento. Esse monstro deve ser contido a todo custo, a falha de qualquer um nessa sala trará infortúnio a Lithia e a morte de muitos.
Liane entendeu com aquelas palavras, mas preferia que o absurdo fosse mentira. Ele tentou atravessar as paredes amareladas, sendo repulsionado de volta e com a superfície da pele queimada.
— Não… Não! Não!
Libertar-se era um esforço inútil. Antes que pudesse ter mais uma chance de se livrar, um pulso de poder divino caiu sobre sua cabeça. Labaredas douradas cobriram suas mãos, ambas que entrelaçavam um vínculo com o selo de Er’Ika e sua própria alma. Lentamente, o fogo entrou na carne, queimando-o por dentro e chegando a cabeça.
Os vasos sanguíneos estouraram, dos poros o sangue escorreu. Trilhas vermelhas escorreram pelos olhos, nariz e boca, enquanto uma dor aguda cruzava do peito aos pés.
Cristal oscilou os anéis na ponta do cetro, pequenos bulbos brilhantes voaram ao redor da barreira do ritual, enquanto seu corpo lentamente oferecia partes de seu poder para sustentar o ritual.
— Deusa, que isso satisfaça a sua vontade, vinde a mim e aos meus servos para selar esse grande mal que caiu sobre nós…
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