Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.
De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!
Capítulo 45: Ignorância Abençoada
Uma habilidade bastante útil para Er’Ika era um banco de dados próprio. De forma simples, a mente de Liane poderia ser avaliado como um amplo espaço cheio de informação, com partes específicas que se especializavam em determinados tipos de memória, indo desde as mais básicas, sobre como andar, falar, até as mais complexas, como raciocinar e interpretar.
A entidade possuía algo semelhante, mas o seu era isolado da criança. O banco de dados de Liane se assemelhava a uma cidade cheia de coisas, contendo os mais diversos segredos e maravilhas, enquanto o de Er’Ika parecia um castelo que flutuava acima dessa metrópole e se mantinha observando o mundo diante dos seus pés. Isto era bom porque significava que podia separar informações específicas para si e nunca revelá-los, o que permitia mentir e guardar coisas que considerava perigoso para o garoto saber, mas ter domínio de tais segredos possibilitava em manipular o seu receptáculo a um nível mais substancial, tal como esconder a realidade do mundo que os rodeava para não deprimi-lo.
O orfanato, comparado a vida média de um cidadão comum, equivalia ao paraíso. As pessoas passavam por péssimas condições de higiene, um banho ao mês era luxo, trabalhando debaixo do sol quente todo dia para arrecadar dinheiro que os manteria até o dia seguinte.
Os mais abastados eram capazes de manter os dentes menos amarelados que a maioria, e isso sem contar nas outras condições específicas sobre economia. A corrupção se escondia debaixo dos narizes de pobres homens e mulheres ignorantes, que mal sabiam a diferença entre seis e meia dúzia.
Er’Ika ficou com medo que revelar tais detalhes desmotivasse o garoto, pois talvez pensar na sua irmã passando por situações precárias ficaria preso em sua mente. No entanto, levantou o mistério: quem diabos sustentava o orfanato? Se a vida mundana era assim, como aquele casarão se manteve por tanto tempo com aquelas crianças? E mais, de onde vinham os mantimentos e as roupas? Ora, o lugar ficava extremamente remoto, fazendo fronteira com uma floresta perigosíssima, era para ninguém morar lá.
O deus continuou inconformado com a dúvida. Já não bastava a existência daquela mulher no sonho, ainda tinham coisas que demorou demais para reparar em como eram ilógicas. Ao menos, estar ao lado de Jessia se tornou um fato lógico, mesmo que Liane tivesse muita dificuldade para engolir.
A entidade sugeriu se manter com ela, mas tinha uma gama de motivos pelos quais insistiu. Er’Ika obteve noção de como era difícil uma pessoa se manter nesse mundo, e também parcialmente entendeu sua economia, aprendendo uma lição extremamente importante: moedas de ouro significavam muito. A bandida carregava consigo uma aljava cheia, até mesmo comprou poções de preços elevados, então andar perto dela significaria estar bem financeiramente se chegassem à civilização.
Outro fator importante era sua ex-profissão de mercenária. Ela podia ser uma criminosa, talvez cartazes com sua face aparecessem nas paredes das vilas, porém ter alguém com experiência na sociedade e que possivelmente saberia onde arranjar uma forma sustentável de se administrar era ótimo. Ele revelou essas coisas à criança, que engoliu com uma péssima expressão no rosto.
Ao anoitecer, quando o céu se transformou do laranja para o lilás, um conjunto de luzes surgiu entre as árvores. Liane cerrou os olhos para observar melhor e confirmou que era a vila. Nas memórias absorvidas pelos pássaros, o ângulo vinha de cima, mas a julgar pela posição daquelas tochas e também das casas, provavelmente era o que procuravam.
— Chegamos… — disse, esfregando as mãos. — Por que tem pouca gente andando do lado de fora?
— É natural, pivete. As pessoas têm medo do escuro. — Jessia deu uma batidinha leve no topo da cabeça do garoto. — Quando a lua aparece, os monstros saem da toca, por isso a maioria já está correndo para ficar protegido pelo muro. Sorte a nossa que locais pequenos como esse não exigem visto ou coisa do tipo, qualquer um pode transitar por aqui.
Saber dessa informação aliviou um pouco o garoto, mas não gostava da atmosfera pendendo acima daquele local. Era como se houvesse algo de errado, e o Er’Ika queria dizer o mesmo, mas de fato uma coisa estranha flutuava pelos ares. A entidade via as partículas dançando no vento carregadas de agentes maléficos, no entanto, permaneceu de boca fechada, querendo primeiro entender a natureza dessas coisas.
— Quando estivermos lá dentro, não sai de perto de mim — alertou a bandida, enquanto o olhava com um rosto franzido. — Gente ruim tem em todo lugar. Se te pegarem e te fizerem de refém, você vai morrer sozinho. Além disso, só use sua magia caso seja inevitável.
— Por que? Você disse que eu era alguém especial, teria problema mostrar isso perto dos outros?
— Crianças com poderes mágicos possuem um valor alto no mercado negro. São muitos os nobres que desejam matar os talentos dos plebeus, e também são inúmeros os magos com seus desejos perturbados de entender qual o limite humano para a magia.
Liane engoliu seco, entendendo muito bem o que aquelas palavras significavam. Por causa disso, ele teve certos problemas em escolher o que fazer em seguida, vendo-se forçado a segurar na mão de Jessia. Desde que estivessem perto um do outro, a chance de ser levado embora reduzia drasticamente.
A velhota riu disso, puxando-o para adentrarem os portões. Um grande aro passou por cima da cabeça de Liane, com “Vila do Dente” escrito de maneira terrivelmente torta na placa de madeira que decorava a entrada. Os guardas que faziam vigília no topo da muralha não se importavam com quem entrasse, sentados em bancos ou rodeando as plataformas de madeira com um semblante recheado de preguiça.
Er’Ika gostava da energia deste lugar, ao contrário de Liane. Havia uma aura pesada, melancólica e estupidamente triste. Pessoas se juntavam nos becos, acobertando-se em trapos para lutar contra o frio, era normal ver um garoto vez ou outra sendo espancado no meio da rua acusado de roubo, ou até escutar os gritos de uma mulher sofrendo violência de um marido bêbado. Para a entidade, uma amante da desgraça alheia, esta vila era um belíssimo jardim de girassois.
— Aperta o passo, garoto, se não eu vou te deixar para trás.
A brincadeira pareceu muito séria para Liane, que precisou continuar em saltinhos, por medo de ser abandonado e devorado por alguma coisa nas trevas. De repente, os humanos atrás da muralha pareciam mais assustadores que os monstros vagando pelo lado de fora.
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