Capítulo 150: Forçando uma Adoção

Sion ficou boquiaberto. Adotar duas crianças? Se fosse dos seus irmãos, ou de uma ramificação da família Tanite, não haveria problema, mas a criança da Bruxa Louca de todas as pessoas no mundo e ainda por cima uma assassina dela? Nunca, nem mesmo nos sonhos mais loucos, imaginou que essa cena aconteceria. Era tanto choque que o marquês paralisou, os papéis presos nas mãos escorregaram pela mesa.

— Vossa Graça?! — gritou Liane, reparando naquela mudança repentina e no seu olhar se perdendo. — Por favor, não morra, Vossa Graça!

Demorou um tempinho para a alma voltar ao corpo. Sion fechou a boca com o punho, recompondo a postura para ativar o lado mais sério de sua personalidade, o jeito que assumia quando questões sensíveis precisavam ser resolvidas por meio do poder de um marquês.

— Liane, primeiro, é uma surpresa muito grande você pedir isso para mim… mas não posso adotá-los. Você deve se lembrar da posição que estou, e como posso receber duras críticas sobre minha atitude. Mesmo sendo novo, sei que é muito inteligente, então creio que entenda como nós adultos não podemos fazer qualquer escolha levianamente.

— Eu entendo, Vossa Graça. — O garoto realizou outra reverência em respeito. — O problema que não posso ignorar o quão em perigo estamos. Meu primeiro pensamento foi ir atrás de você o mais rápido possível.

— Não entendo direito isso. Se você fosse a igreja de Lithia, onde sua avó está, não conseguiria ainda mais apoio do que eu te adotando?

— Isso não é muito possível, Vossa Graça. Os paladinos precisam cumprir muitas missões, além de… haver péssimos boatos sobre a igreja, eu temo pela nossa segurança mesmo com a influência da avó.

Sion pôs a mão no queixo, demonstrando um pensamento bastante profundo à respeito. Ele pediu para que a situção da irmã Zana também fosse explicada, e teve um susto quando descobriu que ela sobreviveu a uma explosão de chamas no centro da cidade. O evento chegou aos seus ouvidos, mas não imaginou que essa mulher estivesse envolvida nas vítimas.

“Ainda assim, é algo monstruoso sobreviver a uma explosão e sair apenas em coma.”

Um suspiro saiu. Essa situação aparentemente lhe daria muita dor de cabeça, ao menos os argumentos de Liane tinham certo sentido. No entanto, uma coisa chamou sua atenção.

— Por que você não pensou em usar a autoridade do bispo Vylon e da paladina Jessia para curar sua irmã?

— Eu pensei nisso, mas temo chamarem um arcebispo famoso e isso traria atenção demais para nós. Também considerei as implicações dentro da igreja, de como pessoas podem nos perseguir por conta desse contato…

“Está correto. Um arcebispo curar repentinamente uma plebeia qualquer teria pouco motivo, eles poderiam virar bodes expiatórios se levarmos em conta o jogo político. Vylon não teria poder divino o bastante para curar por completo alguém de um coma, muito menos a nova paladina…”

Agora, Sion estava genuinamente impressionado com a inteligência dessa criança. Parecia que até falava com uma pessoa diferente, não à toa era o filho perdido da bruxa Isis, florescendo com um talento absurdo. Também havia sobre os relatórios da tutora Niara, que comentava tanto sobre a evolução explosiva de Silva desde a chegada de Liane quanto deixava notas cheias de elogios a respeito de Liane, que demonstrava um domínio alto na esgrima desde o início.

“Você tem muito azar. Se não fossemos de famílias diferentes, ou até se você estivesse agora numa posição de nobreza, eu teria te adotado.” Infelizmente, as ideias do marquês continuavam. — Liane, não posso fazer o que deseja, no entanto, tenho uma solução alternativa. O meu braço direito e homem mais fiel se chama Merk, ele é o capitão das tropas. Ele não tem família, então posso ordená-lo a cuidar de vocês dois por um tempo, enquanto procuramos uma solução para sua irmã.

— Isso seria ótimo, Vossa Graça! — O rosto do garoto se iluminou, parecia até que estrelas brilhavam ao seu redor. — Mas espere um momento, eu pensava que Sir Aymeric era o capitão das tropas…

— Ah, você deve ter entrado em contato com Aymeric na mesma época que minha filha foi… levada. Ele não se recuperou dos ferimentos bem e se aposentou por não conseguir acompanhar os demais.

— Verdade? Não acredito… — Tão rápido quanto ganhou aquela luz, uma onda de tristeza tomou conta de si. — Pelo menos, sabe onde Sir Aymeric está? Eu gostaria de enviar uma carta para ele, sinto que seja necessário, levando em conta a nossa situação.

— Hum. Escreva a carta e me entregue, farei questão de repassar diretamente quando possível.
Liane demonstrou outro sorriso brilhante, e com isso decidido, os dois saíram da sala. Aquilo tirou o temor inteiro de Sion, que estava até então odiando a presença da garota cega com uma aura tão negativa ao seu redor. Tinha até certa pena que o filho da bruxa louca se envolvia em tantos perigos mesmo sem o contato com sua mãe, na realidade, passou a acreditar que Isis era o pior exemplo possível de parente.

Do lado de fora, aquele menino que antes estava insistindo de cabeça baixa na frente de um homem poderoso cantarolava cheio de felicidade.

— Mestre Liane, você é assustador… — disse Celine, enfim falando alguma coisa depois de tanto tempo.

— Hã? Como assim? Eu só fiz o que praticamos em casa!

— Não, ela está certa — complementou Er’Ika, manifestando-se na forma de fada por um momento e pousando no ombro do garoto. — Você é um pequeno monstro. Além de melhorar nas mentiras, aprendeu certinho as aulas de etiqueta que dei e se manteve firme. Ainda teve coragem de quase chorar na frente do marquês, seu idiota.

— Ah, sabe como é, vocês dois me ensinam muita coisa. Hehe.

Liane mostrou a linguinha, sem se importar tanto. Ele mesmo não tinha muita noção do que havia feito, mas aos olhos de Celine e Er’Ika, foi uma incrível demonstração de interpretar um personagem. Poucos momentos depois, Silva reapareceu, puxando sua melhor amiga para o treino diário de esgrima, enfim alegre pela longa reunião dentro daquela sala chata terminar.