Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.
De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!
Capítulo 170: Cultista Demoníaco
A lua de Verdan, encoberta por nuvens pesadas, mal iluminava os corredores secundários da Catedral. As paredes estavam repletas de rachaduras, enquanto os desenhos se desmancharam devido a estrutura partida, com formas geométricas incompletas e imagens de santos inacabadas. Mesmo nas profundezas de um calabouço abaixo da catedral, o eco de uma respiração descontrolada e passos se arrastando pelo piso atravessou por paladinos mortos.
O manto escuro rasgado e as manchas vermelhas revelavam a batalha para se libertar, com sangue vazando dos pés e das mãos, enquanto seu corpo lentamente rumava para uma falência total. Este era o custo da magia demoníaca, a perda da vitalidade em prol do contato com seres maiores — mesmo que pudesse cedo ou tarde tratar as feridas e recuperar sua energia esgotada, ele ainda pagaria o preço por exigir tanto dos demônios quando fosse ao além.
Cada canto do ambiente parecia se fechar conforme prosseguia, sendo caçado pela estrutura num ciclo ao longo do caminho que decidia tomar. Um par de portas de pedra indicaram a saída da cripta, e quando ele as empurrou, sentiu o mundo girar. Apoiado em uma pilastra carcomida, arfou pesadamente. Sua mente ainda assombrada pelo que viu — não, pelo que sentiu naquele dia.
Er’Ika.
O nome proibido tremia em seus ossos.
Os espíritos malignos que o acompanhavam dentro de seu manto sussurraram esse nome desde o momento que o viu. A entidade conversou com ele num idioma que não precisava de palavras. Uma promessa crua de poder, de renascimento para além dos limites humanos. E ele, mesmo esmagado pelo medo, soube que não podia negar.
No final do corredor, um buraco na parede deixava entrar a luz opaca do lado de fora. Era sua rota. Escapou pela fenda, rolando pela terra fria, correndo para dentro da floresta devastada. Flores esmagadas, um vento cortante para a pele, o gelo de uma noite amaldiçoada, aquilo era o cúmulo de um momento ideal para um ritual, mas Dareon, o cultista demoníaco, só desejava escapar.
Não demorou para que patrulhas fossem procurá-lo nos arredores, mas sem sucesso. Bastou ofereceu o sangue de suas mãos para que Muriel, o demônio da gula, viesse ajudá-lo. Sobre o corpo de um cão monstruoso, Dareon navegou para longe de Verdan, escapando dos paladinos e fieis que queriam sua cabeça. Ele já acreditava ser um homem morto desde o momento que entrou naquela cela, mesmo se estivesse fora, ninguém de Lithia descansaria até matá-lo.
Após muito navegar pelos bosques além da cidade, o cultista encontrou uma clareira para descansar. Desabou contra a gama, exausto demais para sequer mover um dedo. Cores carmesins tomavam a vista e também os membros, consequência de usar tanto o poder mágico quanto demoníaco simultaneamente. A criatura invocada pelos favores de Muriel, o cão da gula, farejou-o.
De repente, os olhos vermelhos do ser mudaram, demonstrando um brilho perolado que encarava o homem diretamente na alma pútrida.
— Seu acordo ainda está firmado comigo, Dareon. Dei meus poderes a você e aos seus seguidores, mas não recebi minha oferta; o seu plano falhou.
— Sim, disso sei… Infelizmente, meu azar também foi grande demais para realizar seu desejo, Muriel. — Ele mostrou um sorriso, falando com o demônio como se fosse um amigo de longa data. — Nosso contrato terá de esperar. C creio ser razoável.
— Realmente. Eu não esperava você se encontrar com… aquilo.
— Er’Ika. Os espíritos menores não pararam de repetir esse nome para mim. Ele é mais poderoso do que a própria igreja para você falar assim, inclusive.
— Ele é um deus, humano estúpido.
A voz de Muriel se tornou mais agressiva, a forma de cão demoníaco tremulou pela sua presença querendo se expor naquele ambiente. Labaredas ameaçaram incendiar os arredores, contidos pela vontade dele, mas a qualquer momento o humano se tornaria cinzas se o demônio assim desejasse.
— Antes mesmo de eu existir, ele nos observava. Ele quem se responsabilizou por nos gerar, por criar até mesmo o Rei do Submundo. Não use palavras levianas, do contrário, o pior acontecerá a ti.
— Agradeço as palavras de preocupação…
Darion conseguiu erguer um pouco o tronco e estendeu a mão para a sua sombra, que se mexeu e abriu uma pequena fenda no espaço, permitindo-o pegar um cantil de água e levá-lo a boca. Sua garganta continuava seca mesmo depois de longos goles, resultado da imagem presa na mente, da figura amorfa se arrastando pelos céus da cidade e modificando o conceito da existência apenas por se mover.
Ele teve uma longa carreira até aquele ponto da sua vida, viu inúmeros espíritos malignos e também suas capacidades. Muriel era com quem mantinha contratos há mais tempo, e ainda assim, nunca havia visto uma aparição surreal como aquela. Nem a própria coisa a sua frente ou outros demônios demonstraram uma aura tão aterrorizante, um sentimento de desesperança e de morte iminente.
O coração do cultista palpitou mais forte. Com certeza, se libertasse Er’Ika, o mundo acabaria antes de se dar conta de que morreu, mas seu objetivo era outro, um que ia muito mais além da simples destruição dos mares e das terras. Suspirou, dando a oportunidade para Muriel, quem ainda o olhava com enorme escárnio, tivesse uma pitada de curiosidade.
— Você está com aquele rosto novamente. Que pensamento lhe surgiu?
— Houve um culto de Er’Ika no passado?
— Houveram muitos, mas todos foram erradicados por ele. O submundo inteiro entendeu que esse deus queria passar despercebido, apenas nos analisar e ver o que faríamos. Ninguém nunca o derrotou, e quem tentava, deixava de existir logo após falhar. Se está pensando em algo estúpido, melhor desistir agora, você só se unirá a mim mais cedo que o normal.
— Eu não sou idiota, Muriel — disse, esboçando um sorriso convencido e firmando um círculo demoníaco no chão para outro contrato. — Deve ter algum motivo para que esse deus, que é mais poderoso que o Rei do Submundo, estar no corpo daquela criança. Seja lá qual for o motivo, quero me apresentar como um servo para Er’Ika, e assim posso talvez conseguir meu desejo.
Muriel escutou em silêncio. As partículas no ar giraram, unindo-se no centro do círculo de invocação. Darion se colocou no centro, quase caindo contra o chão pela falta de forças.
— Vamos passar um tempo no submundo primeiro. Preciso me organizar e esperar uma oportunidade para entrar em contato com ele de novo, custe o que custar.
O cultista abriu um portal para o inferno, desaparecendo na noite com Muriel.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.