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    Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.

    De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!

    O caminho pelo bosque parecia se estender infinitamente considerando o quanto os alunos se mantinham calados. Talvez fosse o silêncio incômodo entre os colegas, ou o fato de que todos estavam sendo guiados como carneiros numa trilha ancestral que não inspirava nada além de mistério. Imo caminhava entre os últimos, fingindo distração com uma folha seca que girava sobre os próprios pés ou por uma ocasional borboleta pousando numa linda flor que combinaria com o cabelo de sua atual paixão.

    Ele nunca gostou de excursões, preferia muito mais descansar na cama ou se divertir trapaceando em jogos de cartas com outros nobres. Algo como visitar locais perdidos pelo tempo lhe soava tão chato que inevitavelmente bocejava só de pensar na chatice que seria passar a manhã toda lá. Ao menos, havia um colírio para os olhos no meio das pessoas.

    Liane estava logo à frente, o rosto sempre difícil de ler, mas com uma expressão taciturna que a tornava impossível de se aproximar. Desde o episódio dos bilhetes em aula, a garota parecia ainda mais distante, como se o mundo ao redor rejeitasse sua própria existência. Independente se as pilastras rachadas e cobertas de musgo exibissem uma aura de antiguidade, seu desinteresse continuava, ela apenas caminhava como se aquele lugar não tivesse nada de novo para mostrar.

    “Será que já esteve aqui antes?”, pensou Imo, apertando o passo para não perder de vista sua estranha colega.

    O grupo parou diante de uma escadaria parcialmente afundada no solo. Ela se erguia por meio de uma colina, com degraus irregulares e até alguns faltando da estrutura completa. Trion ergueu o cajado para o alto, que emitiu um pequeno som chamando atenção dos outros, tanto estudantes quanto monitores.

    — Estas são as ruínas de Orton — falou, apontando com o cajado para as estruturas caídas, desde os arranhões nas paredes ao mármore sendo consumido pelo vento. — Foram construídas por uma civilização anterior aos registros escritos da Igreja de Lithia e do reino de Kirstein. Teóricos dizem que aqui era um ponto de encontro ritualístico… outros preferem chamá-lo de observatório espiritual.

    Imo ouviu um murmúrio entre os colegas. A palavra “ritualístico” sempre causava um arrepio coletivo. Mesmo ele, que vinha de uma família tradicional nobre, não gostava da palavra. A maioria associava a demônios e outros seres de cunho negativo, muitas vezes envolvido com forças do além e do desconhecido. Devido ao extremo preconceito com culturas de fora, a maioria considerava que civilizações do passado eram selvagens e escolheram os deuses errados para cultuar.

    Não passava de um racismo estrutural construído em cima de milênios de história perdida, um medo que surgiu por não reconhecerem seus antepassados e optarem pela radiante Kirstein ao invés de procurar pelo tempo perdido daquela terra. Liane sentia algo similar, sua cabeça não parava de pensar em como tudo desapareceu num piscar de olhos, numa época tão antiga que sequer um traço de herança genética foi levada a diante.

    O grupo de alunos subiu pela primeira escadaria na entrada, e em seguida tomaram um caminho para o subsolo, onde se encontrava uma vasta galeria formada de corredores. Os sons de fora desapareceram, substituídos por ecos de passos e pelo barulho de corrente elétrica ocupando os bulbos dos luminorbes que os monitores carregavam.

    O teto era alto, contendo riscos de rachaduras que queriam derrubar o restante das ruínas, e as paredes mostravam relevos estranhos, formas geométricas que se moviam quando encaradas por muito tempo. O local por conta própria sugava a presença de todos, sobrepondo qualquer estilo chamativa com uma aura opressora, onde na escuridão qualquer pessoa seria considerada trivial rente a grandiosidade daquilo que estava diante dos olhos, escondido nas sombras.

    Liane, no entanto, mesclou-se ao ambiente como se fizesse parte dele. Ela puxou o paladino pela manga, indicando para seguir, e avançou numa direção diferente dos outros. De algum modo, uma das suas melhores habilidades era desaparecer diante de qualquer um, a única razão pela qual Imo não a perdeu de vista se devia aos sentimentos conflituosos que sempre faziam sua cabeça se virar na direção dela.

    Liane parou na frente de uma figura entalhada: um grande olho, sem pupila e tinta para representá-lo, misturado às paredes. Ela ergueu a mão e tocou o símbolo sem hesitação. Imo só ficou parado, analisando a expressão diferente que apareceu naquele rosto, de olhos semicerrados e uma boca abrindo e fechando, querendo falar algo que não poderia, mas cujo desejo era imenso. Um múrmurio seu chegou a Grey, no entanto, o paladino somente acenou com a cabeça concordando.

    — Ei… Liane? — chamou Imo em voz baixa, receoso de atrapalhar.

    Não houve resposta. Os dedos dela deslizaram sobre o entalhe como se quisessem sentir uma presença viva ali, buscando uma pessoa inexistente, algo vindo do além. Sua respiração desregulou, o pulmão subia e descia com ritmo quebrado. Não era espanto. Era… reconhecimento.

    — Não era para eu saber disso, né? — murmurou Liane, mais para si mesmo do que para os outros.

    Imo recuou meio passo, desconfortável. Os outros alunos se aglomeravam do outro lado da sala, ouvindo Trion continuar sua explanação sobre os rituais praticados ali pelos povos antigos, uma suposta criatura desaparecida dos relatos e que ninguém achou exatamente como descrevê-la. Era um local sagrado, deturpado pelos exploradores anteriores e que agora se resumia a um grande mistério histórico, mas tudo que Imo conseguia prestar atenção era na figura de Liane, parada diante daquele símbolo como se acabasse de reencontrar um fantasma.

    De repente, ela se virou.

    — Vamos. Não tem mais nada aqui. — Sua voz saiu seca, como se tivesse engolido algo desagradável.

    Grey assentiu e a seguiu conforme as outras pessoas, enquanto Imo procurava um jeito de reagir. Eles nem se conversaram direito, mas ficou mais do que óbvio que algo estava fora do lugar. Podia ser um pressentimento ruim, talvez uma paranoia, só que com certeza um traço errado apareceu. A intuição jovial dizia para se afastar daquela pessoa, que o perigo rondava a espreita para quem se aproximasse dela, mas que tipo de jovem não gostava da adrenalina?

    “Essa garota ainda vai me matar…”


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