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    Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.

    De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!

    Grey ergueu o escudo a tempo de bloquear uma adaga de atingir seu rosto. Um eco metálico reverberou pela escuridão, enquanto ele dava um passo para trás e defendeu do golpe seguinte, tratando de abrir distância para sair do alcance daquela lâmina. Uma das grandes desvantagens de uma adaga era seu tamanho — numa luta onde quem acerta primeiro ganha uma grande vantagem no embate, usar da falta de comprimento na arma dava uma janela enorme de vitória.

    Por isso, quando o paladino enfrentava aquele garoto, sempre se aproveitava do alcance maior da espada como forma de controlar o ritmo da batalha. No entanto, devido a habilidade especial de reforço de Liane, ele conseguia fechar o espaço e aplicar bastante pressão com golpes consecutivos, o que lhe dava um ar perigoso.

    Grey empurrou o escudo para frente e aparou o ataque, o impacto fez com que o braço de Liane fosse para alto, e assim o combate terminou com a espada do paladino voando na direção do pescoço do menino. A ponta parou a centímetros da pele, com o homem retraindo a arma na mesma hora que viu o semblante cheio de adrenalina de Liane ser trocado por uma expressão amena, de quem aceitou sua derrota. Guardou a espada na bainha, limpando o suor da testa.

    — Você tem melhorado bastante. Seu controle na velocidade e na força mostraram um progresso, mas eu ainda acho melhor usar outra arma… Uma lança ou mangual funcionariam melhor do que essa adaga.

    — Entendi. — A resposta veio repleta de desinteresse, com o garoto girando sua adaga entre os dedos até fazê-la desaparecer magicamente da mão. — Eu ainda quero usá-la.

    — É, eu sei que você tem apego a ela, mas pelo menos considere andar com uma espada, tudo bem?

    Um aceno de cabeça e a sessão de treino terminou. Dois pirralhos os encaravam cheios de admiração, respectivamente Solaris e Imo, os enxeridos que quiseram aproveitar a ocasião para estarem perto do garoto. Grey rapidamente entendeu que os ambos foram “sugados” pela excentricidade de Liane, um provavelmente estava caidinho e a outra demonstrava extrema curiosidade, mas ainda não se sentia muito confortável em vê-los a todo momento.

    O plano original era de chamar o mínimo de atenção possível, porém com a presença de Solaris na academia causando tanto problema e ofendendo Liane publicamente, tornou-se impossível de evitar os olhares dos nobres. Essa situação só piorou com a presença de Imo Calvenar, um nobre considerado problemático entre a aristocracia, com seu jeito bruto para homens e a doçura de um mulherengo com as garotas — em outras palavras, alguém cuja vida se resumia a correr atrás de um rabo de saia.

    Inevitavelmente, agora a nobreza oferecia uma boa dose de atenção, talvez até admiração misturada. O problema se concentrava em Seraphina D’Munt, a menina quem buscava uma vingança contra Liane. Desde o começo, Grey entendeu que estavam se metendo numa briga feia, pois a casa D’Munt era famosa por seus sentimentos de rancor e desejos vingativos.

    “É algo do sangue deles, não há muito o que posso fazer além de torcer pela proteção do bispo Vylon e pela proteção da irmã.”

    Ele sentia uma certa vergonha por depender dos outros assim, no entanto, era obrigado a aceitar. Largou um suspiro, puxando o cabelo molhado de suor para trás.

    — Acho que chega por hoje. Vamos voltar ao dormitório antes de haver reclamações dos monitores… se bem que, acredito que eles estejam mais atrás de Imo do que qualquer outra pessoa.

    — Eu? Por que eu? Assobiar para as bonitonas da Academia não é um crime!

    — E ainda assim, tem quem se incomode ao ponto de acionarem uma autoridade para você… — Grey soltou um meio sorriso e cruzou os braços, preferindo não rir do pobre coitado. — Tenho pena de quem você se casar no futuro, a pessoa terá muitas dificuldades em saber desse seu passado.

    Um suspiro saiu do peito do paladino, cujos ombros caíram na mesma hora. Maior parte das luzes na academia haviam sido apagadas, enquanto os corredores passavam por inspeções em busca de alunos fazendo estranhezas. Devido a jovialidade de muitos ali, não era incomum encontrar casos exóticos ou até casais apaixonados nas salas vazias, ou quem sabe alguém pregando uma péssima peça no professor que daria aula no dia seguinte.

    “Não entendo isso, eu nunca fui assim”, pensou, mesmo obviamente tendo muitos episódios de comportamento ruim na infância. — De qualquer modo, melhor irmos. Amanhã vocês terão aula, a coisa que menos desejo é Liane perdendo aulas depois de tanto se esforçar para entrar na Academia.

    Os dois pirralhos mostraram um rosto cheio de remorso. Era verdade que ambos não tiveram muita dificuldade em entrar, pois uma vinha da família real de outro país, enquanto o outro entrou por meio do dinheiro e influência política da casa que nasceu. Diferente de Liane, que cresceu como um plebeu e teve que passar pelos testes comuns para ingressar, ambos tiveram um berço de ouro e muitas vantagens.

    Então, com isso decidido, os quatro se dispersaram. Grey acompanhou Liane rumo ao quarto, tratando de sentar na cama e por sua espada encostada na parede junto do escudo. Ele apertou o símbolo triangular no peito e orou em silêncio, enquanto Liane tratou de arrumar as acomodações para dormir.

    Quando abriu os olhos, viu o garoto sentado na cadeira perto da escrivaninha, escrevendo algo sobre uma superfície do papel com dois livros abertos ao lado. Tomado pela curiosidade, o paladino olhou para as páginas e chegou um pouco perto. Eram símbolos de cultistas demoníacos, tanto os de mão quanto gravados para rituais, estes que Grey reconheceu facilmente, pois um desses livros leu do começo ao fim.

    — Estudando de novo? — disse, apoiando uma das mãos na mesa e apontando para a folha de papel. — Liane, isso está virando uma obsessão sua. Esses poderes são perigosos, envolver-se demais com eles te enlouquecerá…

    — Eu sei, mas… é minha única conexão com Er’Ika.

    A resposta veio com um tom fraco. Desde o começo, o homem entendeu quanta falta a entidade fazia na vida de Liane. Os dois estudaram juntos sobre os assuntos do Demonicon e foram de grande utilidade para a Igreja nas excursões, identificações e também combate de seres demoníacos. Se duvidassem, eles salvaram inúmeras vidas na última década apenas por terem encontrado o livro.

    — Ainda assim, descanse. Você pode estudá-los amanhã e unir com sua leitura dos textos sagrados de Lithia. É importante ainda manter essas informações em xeque, considerando como você de um jeito ou de outro terá conexão com coisas demoníacas, mas esse conteúdo pode te influenciar.

    — Influenciar? — Os olhos vermelhos de repente se abriram, com ele virando a cabeça lentamente para seu guarda-costas. — Como assim?

    — Hah. A maioria dos cultistas demoníacos só se tornaram o que são por curiosidade. Uma vez que peguem e tentem as práticas ocultas, não há volta, eles continuarão procurando conhecimento e domínio. Imagine que é o mesmo para os magos: eles amam magia e testam de tudo para se conectar mais a essência dela. Uma vez usado um ritual, a pessoa se sente tentada a fazer mais e mais, então é um ponto sem volta.

    Liane permaneceu quieto durante a explicação. Estava mais do que claro como sua cabeça parecia processar aquelas palavras, temendo o que havia por trás e também ganhando um lapso de culpa. Grey fechou ambos os livros, um deles sendo o Demonicon e o outro desconhecido. Pretendia no dia seguinte perguntar a respeito, agora o que importava era dormirem.

    Ele não queria pensar no que aconteceria se o garoto se encontrasse imerso nas artes ocultas, comunicando-se com demônios e realizando pactos. Preferia que Liane ficasse do lado deles, mesmo sem demonstrar aptidão nenhuma para poderes divinos e sem muita expertise na área. Aquilo garantia uma segurança, uma que Grey torcia do fundo do coração para acontecer, temendo o futuro contra um Liane unido de seres infernais.

    — Descanse e não pense demais. Amanhã será um bom dia, isso que importa.

    Com isso, o paladino deu as costas e se deitou na cama. A lamparina contendo um luminorbe se apagou, assim a escuridão e o silêncio consumiram o quarto. Mesmo que Grey tivesse um sono leve, podendo acordar no menor sinal de movimento dentro do quarto, ele nunca acordou com Liane perto. Não sabia ao certo se era porque o garoto dormia como pedra e nunca saia da cama, mas às vezes tratava de levantar o corpo apenas para verificar se ele ainda estava ali.

    Mal sabia o paladino que Liane sempre teve os pés leves.


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