Ei, você é curioso? Se for, que bom, deixo saberem o quanto quiserem de mim! Pra começo de conversa, eu sou um sapo mágico, tá ligado? Eu sei que minha foto de perfil engana, mas é sério! Infelizmente, estou preso no fundo do poço, minha sabedoria não pode sair desse lugar, mas você pode sempre vir aqui e jogar uma moedinha ou perguntar ao sapo do poço sobre sua sabedoria.
De qualquer forma, esse sapo já foi autor de outras coisas, sabia? Ele também ensina e faz trabalhos relacionados a escrita! Bizarro? Com certeza é um sapo mágico, oras! Agora, se encante com minha magia e leia todas as minhas histórias (e entre no discord), simsalabim!
Capítulo 98: Despedida Ruim
Crianças seguem os adultos, a opinião dos pequeninos pouco importa, já que os mais velhos eram mais sábios, mais experientes e mais fortes. Poderia ser eufemismo falar de tal forma, no entanto, era assim que Relena percebia o mundo ao redor. Os adultos sempre tinham razão, sempre estavam acima e sempre colocavam suas próprias vontades acima dos outros — e naquele exato momento, o desejo deles era enviar seu melhor amigo para longe.
A irmã de Grey nasceu. Isso era um ótimo sinal para as pessoas do vilarejo, uma menina aparecer ali no campo trazia boa sorte a mãe e a família, porém, Dilia considerava aquele o lugar errado para crescer uma dama. Relena às vezes nutria um ódio por essa mulher se demonstrar tão mesquinha e ignorante para com os outros, como se tivesse sido mimada desde a infância, e por isso ela queria a todo custo manter o amigo naquele vilarejo ao invés de permiti-lo ir embora.
A menina não sabia, mas Dilia possuía muito medo. Medo de ver sua pobre filha crescer da mesma forma que a mãe, na pobreza, na sujeira e com as mãos calejadas de tanto arar o chão com uma enxada. Todos os anos no campo trouxeram um trauma irreversível quando sua vida se tornou melhor, e por uma mera questão de empatia, Cristal, a sua filha recém-nascida, deveria ter uma infância agradável.
Infelizmente, para uma criança que era impossibilitada de ler mentes, a partida de Grey doía.
No meio da noite, Relena saiu do quarto dos pais — local onde todos dormiam por falta de espaço. — e invadiu o cômodo em que os outros dormiam, aproximando-se do garoto no chão enrolado numa manta. Era incomum aparecer em tal horário, mas levando em conta a situação, não havia outra escolha. Um chute o atingiu na costela, não muito forte ao ponto de doer, mas repentino o bastante para fazê-lo dar um salto de susto. Assim que acordou, Relena tapou a boca dele, pondo o mindinho no meio dos lábios para que continuasse quieto.
Grey rapidamente entendeu o gesto, acompanhando-a para descobrir o que queria, apenas para ser levado ao lado de fora. Estava muito escuro, nem mesmo a lua deu as caras em meio àquela noite fria. Uma brisa gentil acariciou as flores e a grama, desenhando o percurso pelo qual as crianças andaram, rumo à parte mais alta da planície. O anjo de terra continuava ali estirado na terra, marca do dia anterior, assim como os gravetos presos contra o chão que foram usados de falsas espadas.
Relena parou, olhou ao redor e respirou fundo. Ela envolveu o braço por cima dos ombros de Grey e o puxou para baixo, assim ambos ficaram um do lado do outro. O menino continuava sem entender direito o que isso significava, querendo especialmente entender o motivo da invasão no meio da madrugada. Uma pena que seu amigo evitou responder de imediato, optando pelo silêncio que os ventos carregavam e um olhar amargurado para o horizonte.
— Você vai mesmo embora? Não tem como… ficar aqui? Com o papai e com os outros.
— Bem, a mãe quer, eu vou com ela independente pra onde for. Por que? Vai dizer que vai ter saudade de mim agora, hein?
— Vou — confessou, abaixando os olhos em direção ao vilarejo. — Eu vou sentir sua falta.
Grey emudeceu. Era costume seu brincar e provocar as pessoas próximas, especialmente Relena com quem passava maior parte do tempo. Os dois se tratavam dessa forma porque se adaptarem a leveza e a fata de cordialidade, no entanto, havia muita dificuldade em responder algo tão sincero. Era incomum fragilidades aparecessem quando o sonho de se tornar um grande guerreiro existia, logo, nunca viu uma sinceridade como aquela. Essa era a primeira vez.
— Papai vive me dizendo que vou mudar quando crescer… — continuou Relena, agora abraçando as pernas e encostando o queixo nos joelhos. — Ele vive falando que vou encontrar alguém que amo, me casar e ser feliz em algum canto. “É a ordem natural das coisas”, ele diz. Os outros dizem as mesmas coisas, e nem ficam perto de mim porque quero fazer coisas diferentes.
Os olhos marejaram, ameaçando lançar lágrimas para irrigar as raízes do solo. Era um sofrimento salgado, igual as gotas querendo despencar do rosto.
— Todo mundo me evita, hicup… todo mundo fala que sou diferente. O que eu tenho de errado…?
— Re-Relena, não tem nada de errado contigo! — O desespero ficou tão óbvio que a qualquer momento o outro pararia de chorar por causa disso. — Eles só são idiotas, só isso!
— Se não tem nada de errado comigo, então porque fico recebendo olhares e as pessoas me evitam?
— Porque… eh… — Grey engoliu seco, sua mente ficou branca, sem nada para falar, até enfim uma palavra vir para salvar sua pele. — Porque eles não te conhecem de verdade. Eu te conheço de verdade, sei que você nunca faria nada de errado e que você é uma pessoa muito bondosa.
Em seguida, ele resolveu lembrar de uma história que aconteceu, de quando um pássaro caiu dentro do poço do vilarejo e Relena desceu até o fundo para resgatá-lo. Aquilo foi um momento mágico, pois com certeza ninguém se daria o trabalho de salvar aquela vida. Grey lembrava muito bem da cena, de quando Relena subiu pelos tijolos de pedra com musgo sobre o corpo inteiro, tomando o maior cuidado do mundo para deixar o passarinho num lugar seguro.
Dali em diante, foi o momento que o garoto passou a gostar de companhia daquela criança estranha. Claro, ele omitiu a parte de chamar de “estranha”, mas foi fácil de entender o que queria dizer.
A criança ao lado de Grey engoliu o choro, apenas fungando para evitar do catarro escorrer para as pernas. Gostou de fato de ouvir aquilo, de lembrar desse momento que sequer passava pela mente. Um sorriso floresceu no rosto, com um pequeno calor inundando o peito que perdeu um peso.
— Valeu, idiota. — Deu um soco no ombro do garoto, apenas para mostrar a língua e correr pelo campo.
— Ei! Eu fiz um discurso muito bonito e você me trata assim!
Por pura raiva, Grey também a perseguiu, e os dois rolaram pelas flores e pela terra no meio da noite, aproveitando o orvalho e a frieza das estrelas distantes. Aquele instante, aquela mero momento da infância, se eternizou na memória de Relena, que jamais esqueceu da mão estendida em sua direção. Ela prometeu a si mesma que os dois um dia se reencontrariam, mesmo que precisasse derrubar uma montanha para se verem novamente.
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